O capital e a ecologia das doenças

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46 min readSep 27, 2022

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por John Bellamy Foster, Brett Clark e Hannah Holleman. Publicado originalmente em Monthly Review em 1 de junho de 2021.

Traduzido por Débora Cunha. Revisado por Rafaela Milara.

“Os antigos filósofos gregos”, escreveu Friedrich Engels em Do socialismo utópico ao socialismo científico, “eram todos dialéticos inatos”.1 Em nenhum lugar isso era mais aparente do que no pensamento médico grego antigo, que se distinguia por sua forte base materialista e ecológica. Essa abordagem dialética, materialista e ecológica da epidemiologia (do grego antigo epi, significando “em” ou “sobre”, e demos, “o povo”) foi exemplificada pelo texto hipocrático clássico Airs Waters Places [Ares águas lugares] (c. 400 AC), que começa:

Quem quiser investigar a medicina de maneira adequada, deve proceder assim: em primeiro lugar, considerar as estações do ano e os efeitos que cada uma delas produz, pois nem todas são iguais, mas diferem entre si quanto às suas mudanças. Depois os ventos, o quente e o frio, principalmente os comuns a todos os países, e depois os peculiares a cada localidade. Devemos também considerar as qualidades das águas, pois, assim como diferem de outras em sabor e peso, também diferem muito em suas qualidades. Da mesma maneira, quando alguém chega a uma cidade da qual é estranho, ele deve considerar sua situação, onde está em relação aos ventos e ao nascer do sol… Essas coisas devem ser consideradas com mais atenção, e quanto às águas que os habitantes usam, sejam elas pantanosas e leves, ou duras, e correndo de situações rochosas elevadas, e então se salgadas e impróprias para cozinhar, e o solo, seja nu e deficiente em água, ou arborizado e bem regado, e se está em uma situação oca ou confinada, ou se é elevado e frio; e o modo como os habitantes vivem, e quais são suas aspirações, se gostam de beber e comer em excesso, se são dados à indolência, ou gostam de exercícios e trabalho…

Pois se alguém conhece bem todas essas coisas, ou pelo menos a maior parte delas, não pode deixar de saber, quando chega a uma cidade estranha, tanto as doenças peculiares ao lugar, quanto a natureza particular de suas doenças comuns, de modo que ele não terá dúvidas quanto ao tratamento das doenças, nem cometerá erros, como é provável quando não se tenha considerado previamente essas questões. E, em particular, conforme a estação e o ano avançam, ele poderá dizer quais doenças epidêmicas atacarão a cidade, seja no verão ou no inverno, e o que cada indivíduo estará em perigo de experimentar com a mudança no regime… Pois, juntamente com as estações, os órgãos digestivos dos homens sofrem uma mudança.2

Um elemento-chave dessa visão foi a noção de uma relação dialética entre o corpo e o meio ambiente, de tal forma que o corpo estava situado ou corporificado em um determinado lugar e sob condições naturais específicas (ar e água), produzindo uma visão, como o historiador da medicina Charles E. Rosenberg indicou, que era “holística e integrativa — a qual poderíamos chamar de ecológica e sociológica”.3

Na verdade, na Grécia antiga, a medicina foi bifurcada. Os escravos tinham médicos escravos e os cidadãos tinham médicos cidadãos, que atuavam em condições bastante diferentes.4 O autor hipocrático de Airs Waters Places escrevia especificamente para médicos cidadãos e, portanto, esse tratado refletia a natureza de classe da sociedade grega. Não obstante, representava uma abordagem geral que influenciaria o desenvolvimento posterior da epidemiologia por milhares de anos.

O grande herdeiro da abordagem ambiental e dialética da saúde no início da era capitalista foi Bernardino Ramazzini (1633–1714), cujo trabalho pioneiro em The Diseases of Workers [As doenças dos trabalhadores] foi, como Karl Marx enfatizou em O capital, o tratado fundamental sobre “patologia industrial”, ou o que agora é conhecido como o campo da saúde ocupacional e ambiental.5 Ramazzini explorou as doenças ocupacionais associadas aos mineradores de metais, douradores, químicos, pintores, trabalhadores do enxofre, ferreiros, limpadores de latrinas e fossas, pisoeiros, prensadores de óleo, curtidores, trabalhadores do tabaco, carregadores de cadáveres, parteiras, amas de leite, cervejeiros, padeiros, moleiros, cortadores de pedra, lavadeiras, fazendeiros, trabalhadores que ficam em pé, trabalhadores sedentários e muitas outras categorias ocupacionais e condições de trabalho. Ele conscientemente incorporou o ponto de vista de Airs Waters Places ao transcender a bifurcação que existia na medicina grega entre cidadão livre e escravo, e examinar as condições ambientais das ocupações mais humildes. Ele escreveu: “Quando um médico visita uma casa da classe trabalhadora, ele deve se contentar em sentar em um banquinho de três pernas, se não houver uma cadeira dourada, e deve reservar um tempo para seu exame; e, às perguntas recomendadas por Hipócrates, ele deve acrescentar mais uma: qual é a sua ocupação?”.6

Em meados do século XIX, Marx viu o trabalho de Ramazzini sobre patologia industrial, que estendeu a epidemiologia às ocupações da classe trabalhadora, como a chave para o desenvolvimento da saúde pública, conforme formulada por médicos radicais do século XIX. As implicações históricas expandidas disso em vista da ascensão do capitalismo industrial foram apresentadas em meados da década de 1840 no livro de Engels, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. Em meados da década de 1860, Marx voltou-se para o trabalho de Engels e para as investigações mais recentes sobre saúde pública, procurando explorar as condições ambientais da classe trabalhadora nas páginas de O capital. Do início a meados do século XIX foi a era das grandes reformas sanitárias, muitas vezes lideradas por médicos radicais. Foi também uma época de grandes mudanças na medicina, com o desenvolvimento do microscópio e o surgimento da teoria da patologia celular na obra de Rudolf Virchow, que desempenhou um papel formativo na criação da epidemiologia social e ajudou a estabelecer uma abordagem ambiental geral das epidemias baseada no trabalho de Engels.

No entanto, as investigações epidemiológicas do final do século XIX e do início do século XX seriam dominadas pela teoria dos germes da doença e pelos lendários avanços dos “caçadores de micróbios”.7 A ênfase estava em desenvolvimentos específicos da biomedicina no combate a epidemias, como aqueles associados ao desenvolvimento de vacinas e antibióticos. Esses avanços na biomedicina eram logicamente compatíveis com uma abordagem ecossocial da epidemiologia, como pode ser visto no trabalho de E. Ray Lankester — protegido de Charles Darwin e Thomas Huxley, amigo íntimo de Marx e um colaborador próximo de Louis Pasteur. No entanto, a tendência geral era, cada vez mais, deixar as questões ambientais abrangentes de lado enquanto inimigas do capital.8 Em meados do século XX, um modelo biomédico reducionista triunfou sobre perspectivas ambientais mais abrangentes, deixando de lado as notáveis ​​realizações de pensadores ecossociais, como Engels, Marx, Virchow e Lankester, junto com os de Florence Kelley, W.E.B. Du Bois, Alice Hamilton, Norman Bethune e Salvador Allende.

A marginalização, em meados do século XX, das abordagens socioambientais da epidemiologia foi justificada, em grande parte, pelo que foi retratado como o triunfo completo da medicina moderna sobre as doenças infecciosas. Em 1971, Abdel R. Omran apresentou sua teoria da “transição epidemiológica”, que argumentava que as doenças infecciosas eram essencialmente fenômenos do passado nas economias desenvolvidas, varridas pelo processo de modernização. Embora as doenças infecciosas ainda estivessem presentes nas economias subdesenvolvidas, postulou-se que elas simplesmente desapareceriam com o avanço do desenvolvimento econômico.9 Consequentemente, foi proposto que as preocupações com a saúde deveriam se concentrar no aumento concomitante das doenças degenerativas. A concepção da transição epidemiológica permaneceu sendo — pelo menos até o surgimento da covid-19 — a abordagem geral mais influente na evolução da saúde ambiental. No entanto, começou a apresentar falhas e passou a ser cada vez mais modificada (se não totalmente refutada) devido a duas categorias de críticas: 1) a falha em levar em conta as crescentes desigualdades em saúde (particularmente de classe e raça) nas sociedades capitalistas desenvolvidas; e 2) a enorme expansão da globalização capitalista, levando à disseminação de doenças — que não estavam simplesmente confinadas aos países tropicais pobres, pois também ameaçavam as nações do núcleo capitalista.10

Como declarou o ecologista de Harvard Richard Levins em “Is Capitalism a Disease?” [“O capitalismo é uma doença?”), o surgimento, no final do século XX, de uma nova série de patógenos, incluindo o retorno da malária, da cólera, da dengue, da tuberculose e de outras doenças clássicas, associadas ao ebola, à AIDS (HIV), à legionelose, à síndrome do choque tóxico e à tuberculose resistente a múltiplos medicamentos — aos quais agora podemos adicionar outras, como H1N1, H5N1, MERS, SARS e covid-19 (SARS-CoV-2) — apontou para o fracasso completo da teoria da transição epidemiológica. Diante disso, Levins insistiu que, “no lugar de uma doutrina da transição epidemiológica, sustentando que as doenças infecciosas simplesmente desapareceriam com o desenvolvimento dos países, precisamos colocar uma proposta ecológica: aquela com qualquer mudança importante no modo de vida de uma população (como densidade populacional, padrões de residência, meios de produção), também havendo uma mudança em nossas relações com os patógenos, seus reservatórios e com os vetores de doenças.”11 Essas mudanças ocorreram como resultado da onda de globalização neoliberal e expansão do agronegócio no meio do século, desde que a transição epidemiológica foi postulada pela primeira vez, levando a uma nova ênfase crítica na ecologia das doenças e suas relações com a crise estrutural do capital.

A ruptura epidemiológica

Os principais críticos das condições da classe trabalhadora no século XIX consistiam em médicos radicais que personificavam muitos dos aspectos mais progressistas da ciência e da cultura burguesas, muitas vezes indo contra a lógica da sociedade capitalista, frequentemente assumindo valores socialistas. Foi em parte nesse contexto, além da economia política, que Marx e Engels desenvolveram grande parte de sua crítica do capital. A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels, escrito em 1844, foi fortemente baseado em suas observações em primeira mão, conforme ele caminhava pelas ruas de Manchester em todos os horários do dia e da noite, às vezes guiado por sua parceira, a jovem e vivaz proletária irlandesa Mary Burns.12 Mas Engels também de baseou muito nas investigações de médicos radicais, como Peter Gaskell, James Phillips Kay e Thomas Percival, de Manchester. Nas décadas de 1820–1840, a classe dominante inglesa foi motivada a examinar as condições dos trabalhadores e a realizar reformas sanitárias, em grande parte devido à propagação de epidemias de cólera, tifo, febre tifoide, escarlatina e outras doenças, que, embora sempre fossem piores nas vizinhanças dos pobres, frequentemente expandiram-se aos domínios dos ricos. No entanto, os médicos que realmente assumiram a tarefa de remediar esses males eram, muitas vezes, como o Dr. Lydgate em Middlemarch, de George Eliot, pensadores livres, que viam a medicina como “apresentando o intercâmbio mais perfeito entre ciência e arte”, apontando para a necessidade de reforma social radical e a rejeição das tendências “venais” de uma sociedade de nexo monetário.13

É notável que Kay, Gaskell e Southwood Smith — esse último de Londres, em quem Engels deveria confiar — foram todos treinados em Edimburgo, que, junto com Glasgow, foi a fonte do Iluminismo escocês, às vezes vista como o berço da sociologia clássica. Os principais intelectuais do Iluminismo escocês, como Adam Ferguson e James Millar, bem como Adam Smith, promoveram uma ampla perspectiva da história natural, que era geralmente materialista e empirista em sua orientação filosófica.14 Henry Julian Hunter, a quem Marx admirava, formou-se em medicina. em Aberdeen.15 Edwin Lankester obteve seu treinamento médico na Alemanha, onde adquiriu perspectivas críticas sobre a sociedade burguesa.16 Entre os principais médicos radicais da época na Grã-Bretanha que influenciariam Engels e Marx, John Simon, o oficial médico do Conselho Privado, e Edward Smith, autor de Health and Disease [Saúde e doença] (1861), destacaram-se por terem recebido seus diplomas de medicina em universidades inglesas, o primeiro no King’s College, da Universidade de Cambridge, e o último, na Royal Birmingham Medical School.17

Com base em suas próprias observações, na literatura cartista e nos médicos radicais da época, o jovem Engels, em 1844, descobriu as terríveis condições ambientais da classe trabalhadora na Inglaterra no meio da Revolução Industrial, focando tanto nos fatores que levam a epidemias quanto nas doenças ocupacionais e nas deficiências nutricionais. Entre suas descobertas, exploradas em grande detalhe, estava a mortalidade muito maior da classe trabalhadora em comparação com a classe capitalista. Em um ponto de seu texto, ele se baseou em um estudo de Chorlton-on-Medlock — na época, um subúrbio de Manchester (e, agora, parte da cidade) — realizado pelo médico P. H. Holland, que dividiu tanto ruas quanto casas em três classes qualitativamente distintas, de ricos a pobres. Como Engels explicou, os dados resultantes mostraram que a mortalidade nas “ruas da terceira classe [era] 68% maior do que nas da primeira classe”, enquanto a mortalidade nas casas da terceira classe era “78% maior do que naquelas da primeira classe”.

Em Liverpool, como Engels indicou com base em relatórios parlamentares, “a longevidade média [isto é, a expectativa de vida ao nascer] das classes altas, pequena nobreza, profissionais liberais etc. era de trinta e cinco anos”, enquanto a da classe trabalhadora era de quinze anos. A razão pela qual a expectativa de vida era tão abissalmente baixa tinha a ver com a alta taxa de mortalidade infantil. Em Manchester, “mais de 57% das crianças da classe trabalhadora morrem antes do seu quinto ano, enquanto apenas 20% das crianças das classes mais altas… Epidemias em Manchester e Liverpool são três vezes mais fatais do que em distritos rurais… Casos fatais de varíola, sarampo, escarlatina e tosse convulsa entre crianças pequenas são quatro vezes mais frequentes”.18 Como sua análise mostrou, as classes trabalhadoras sofriam de maior morbidade e mortalidade em todas as idades e sexos, com as minorias étnicas (na época, na Inglaterra, principalmente irlandesas) sofrendo de forma muito mais massiva.19 Engels argumentou que essas condições desiguais eram produto do sistema de acumulação de capital e constituíam, nesse sentido, uma forma de “assassinato social”.20

Na Alemanha, Virchow, o médico e patologista alemão, famoso pela autoria de Cellular Pathology [Patologia celular] (1858), baseou-se em A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels, em seu próprio trabalho pioneiro em epidemiologia social, utilizando algumas das estatísticas desse último sobre mortalidade baseada em classe. Designando epidemias de cólera e tifo como “doenças de multidões”, Virchow desempenhou um papel de liderança na reforma sanitária em Berlim. Nos Estados Unidos, o livro de Engels influenciou a liderança em ativismo socialista e reformadora social Florence Kelley, amiga próxima e correspondente frequente de Engels que traduziu A situação da classe trabalhadora na Inglaterra para o inglês em 1887. Ela residiu por um tempo na Hull House, em Chicago, onde desenvolveu mapas que documentam as áreas empobrecidas da cidade, identificando bairros com códigos de cores conforme suas etnias e classes para revelar formas específicas de desigualdades. Mais tarde, como chefe dos inspetores de fábrica do estado de Illinois, ela lutou contra casas de trabalho, cortiços, trabalho infantil e uma epidemia de varíola. Ela se tornou uma figura importante na batalha pela reforma das condições sociais e ambientais da classe trabalhadora, e particularmente das mulheres, nos Estados Unidos. Como declarou o juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos, Felix Frankfurter, em 1953, Kelley foi “uma mulher que teve provavelmente a maior participação na formação da história social dos Estados Unidos durante os primeiros trinta anos deste século”, respondendo às condições de “industrialização frenética”.21 Em 1900, a taxa de mortalidade por febre tifoide nos Estados Unidos, de acordo com o cientista e socialista britânico Lancelot Hogben, era de trinta e seis por mil, mas havia caído para seis por mil em 1932, em grande parte devido aos reformadores sanitários, dos quais Kelley foi um dos principais.22

Um pouco mais de vinte anos depois, Marx tratou de muitas das questões epidemiológicas abordadas em A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels, em O capital. Para Marx, as “epidemias periódicas” que Engels havia explorado eram tanto uma manifestação da “ruptura irreparável no processo interdependente do metabolismo social” quanto da “adubação dos campos ingleses com guano” do Peru.23 Nesse sentido, uma ruptura corpórea em morbidade e mortalidade humana deveria ser vista como parte de uma ruptura metabólica mais abrangente na relação da humanidade com a natureza por meio da produção social.24 Ao analisar a ruptura ecológica/epidemiológica do capitalismo, Marx baseou-se fortemente no trabalho de médicos ingleses radicais dos anos 1860, particularmente Simon, a quem ele considerava um dos grandes críticos do capitalismo da época, junto com Hunter, Edward Smith e Edwin Lankester (cuja obra Marx conhecia indiretamente) — todos os quais trabalharam em várias funções com Simon.25 Marx preencheu várias páginas de O capital com abordagens das causas sociais e de classe das epidemias, deficiências nutricionais, diferenciais de mortalidade (incluindo alta mortalidade infantil) e condições de habitação e saneamento. As avaliações de médicos radicais que investigavam o estado da saúde pública, nas palavras de Marx, fervilhavam “de ataques heterodoxos à ‘propriedade e seus direitos’”.26

Ao lado do próprio Simon, que, apesar de sua posição elevada no topo da estrutura de saúde pública inglesa, era um autodenominado “socialista” preocupado com as condições “proletárias”, o médico radical que Marx mais admirava era Hunter, que fazia parte de um dos talentosos grupos de médicos que Simon lançou mão para investigar as condições de saúde dos trabalhadores na Inglaterra e no País de Gales.27 Marx caracterizou as investigações de Hunter no sexto, sétimo e oitavo relatórios de saúde pública (1864–1866) sobre mortalidade infantil, nutrição, saneamento e epidemias, e as condições gerais de vida dos trabalhadores em toda a Inglaterra, como nada menos do que “marcadoras de uma época”, baseando mais de uma dúzia de páginas de O capital na pesquisa in loco de Hunter.28 Com relação à habitação, Hunter destacou o absurdo da exigência nacional de “fornecer cobertura [habitação] para aqueles que, por não terem capital, não podem provê-la para si mesmos, embora possam, por meio de pagamentos periódicos, recompensar aqueles que irão fornecê-la”. Essa falta de capital por parte da população trabalhadora e os aluguéis exorbitantes que deviam ser pagos com seus salários irrisórios, somados às frequentes expropriações por proprietários de terra, levaram Marx a se referir com sarcasmo ao “admirável caráter da justiça capitalista”.29 A superlotação, medida pela falta do espaço cúbico necessário para os habitantes (bem como a falta de janelas, instalações sanitárias adequadas e água potável) foi, ele indicou, o terreno fértil para uma série de epidemias, incluindo varíola, cólera, tifo, febre tifoide, escarlatina e tuberculose.30

Marx forneceu muitos dos elementos do que hoje chamamos teoria “ecossocial” da distribuição de doenças. O início de uma ferrovia de Lewisham a Tunbridge (agora Tonbridge), explicou ele, teve a consequência não intencional de espalhar uma epidemia de varíola na paróquia de Seven Oaks, a cerca de cinquenta quilômetros da atual Londres. A melhoria do transporte em condições capitalistas pode, portanto, ser vista como um fator que leva a uma disseminação mais rápida de doenças infecciosas. Da mesma forma, o sistema de turmas do trabalho agrícola no campo contava com trabalhadores migrantes que consistiam, em grande parte, em mulheres e crianças, transferidas de um lugar para outro em resposta às exigências do capital, a fim de servir projetos relacionados à construção como “obras de construção e drenagem, fabricação de tijolos, queima de cal e fabricação de ferrovias”. O resultado, declarou Marx, foi “uma coluna voadora de pestilência”, levando “varíola, tifo, cólera e escarlatina para os lugares em cuja vizinhança ela [a turma de trabalho migrante] estabelece seu acampamento”.31

Para Marx, tudo isso, é claro, estava relacionado à ruptura metabólica gerada pelo capitalismo entre a humanidade e a natureza como um todo — incluindo o que pode ser visto como uma ruptura corpórea (ruptura epidemiológica) na existência corporal humana. Em todos os momentos, era necessário, ele enfatizou, levar em consideração “o movimento cíclico das condições da vida humana”, isto é, o metabolismo social humano.32 Em Seventh Public Health Report [Sétimo relatório de saúde pública], Hunter explorou os “direitos senhoriais” sobre o esterco que os proprietários de terras de Durham exerceram sobre os pobres da região. Como Marx, citando Hunter, explicou: “É curioso observar que o próprio estrume do trabalhador agrícola é privilégio do senhor calculista … e o senhor não permitirá que exista nenhuma propriedade privada, exceto a sua própria, na vizinhança, e prefere ceder um pouco de estrume aqui e ali para um jardim do que diminuir qualquer parte de seu direito senhorial”.33 O objetivo da aristocracia e da pequena nobreza ao impor essas condições era capturar e monopolizar o próprio estrume produzido pelos trabalhadores, a fim de fertilizar os campos das propriedades dos senhores.

Da mesma forma, Marx destacou as condições ambientais gerais dos mineiros, que, além de trabalhar em uma das mais perigosas de todas as ocupações, eram frequentemente forçados a viver na propriedade do proprietário da mina com aluguéis exorbitantes cobrados por casas decrépitas, a fim de simplesmente poderem lá trabalhar. Aqui, ele citou a visão um tanto preconceituosa de Simon, de que “os trabalhadores … não têm educação suficiente para saber o valor de seus direitos sanitários, [de modo] que nem o alojamento mais obsceno e nem a água potável mais suja serão incentivos apreciáveis para uma ‘greve’”.34 A exploração dos mineiros e de suas famílias estava, nesse caso, diretamente ligada à expropriação dos próprios meios de vida — não apenas dentro, mas fora da mina.

Ao explorar as condições epidemiológicas dos trabalhadores, Marx prestou muita atenção à sua ingestão nutricional, baseando-se nos dados de Edward Smith, mostrando que os trabalhadores industriais eram deficientes em carboidratos e proteínas, em comparação com presidiários, sendo, em muitos casos, incapazes de “evitar doenças de fome”, devido à baixa ingestão nutricional. As mulheres eram geralmente as mais subnutridas.35 Mulheres da classe trabalhadora com filhos pequenos, muitas vezes, não tinham escolha a não ser simplesmente amamentá-los antes de irem para o trabalho e novamente após, geralmente com um intervalo de doze horas ou mais. Como Marx reportou, com base em Hunter, as crianças, deixadas com “enfermeiras” idosas, muitas vezes, eram alimentadas com misturas artificiais, como o xarope Godfrey’s Cordial, contendo ópio para mantê-las sedadas. Por essa e outras razões, crianças pequenas em distritos da classe trabalhadora morreram em grande número.36

Não menos preocupante eram as doenças ocupacionais, resultantes de formas extremas de exploração, particularmente as condições impostas às mulheres no trabalho informal. A descrição de Marx da condição de excesso de trabalho e superlotação, em seu capítulo sobre “A jornada de trabalho” em O capital, baseou-se nas descrições das condições de mulheres jovens trabalhando como costureiras em casas de madames, publicadas em vários jornais de Londres, em junho de 1863, com base no Report of the Medical Officer of Health to the Parish Vestry of St. James [Relatório do médico oficial de saúde da Paróquia Sacristia de St. James], de Edwin Lankester.37 As reportagens dos jornais de 1863 se baseavam no relato do velho Lankester sobre a morte de Mary Ann Walkley, de 20 anos, empregada em um estabelecimento de costura dirigido por Madame Elise, uma das mais conhecidas modistas de Londres. Walkley, junto com outras sessenta mulheres jovens, foi forçada a trabalhar vinte e seis horas e meia sem interrupção, enquanto confinadas trinta em uma sala, com apenas um terço dos pés cúbicos necessários por pessoa para garantir a entrada de ar adequada. Para Marx, esse foi um exemplo claro de excesso de trabalho e injustiça social e ambiental, representando as condições em que os proletários em geral foram colocados, reduzindo sua expectativa de vida geral — se não extinguindo suas vidas em poucas horas, como no caso de Walkley.38

Ao considerar as condições epidemiológicas da classe trabalhadora, uma passagem de Simon foi tão importante para Marx que ele a citou na íntegra tanto no primeiro quanto no terceiro volumes de O capital:

[É] praticamente impossível … para os trabalhadores insistir naquilo que em teoria é seu primeiro direito sanitário — o direito de que, independentemente do trabalho que seu empregador os reúna para fazer, será, na medida em que dele depende e às suas custas, despojado de todas as circunstâncias desnecessariamente prejudiciais… Embora os trabalhadores sejam praticamente incapazes de exigir essa justiça sanitária para si próprios, eles também (não obstante as supostas intenções da lei) não podem esperar qualquer assistência eficaz dos administradores nomeados das Nuisances Removal Acts [Leis de Remoção de Inconvenientes]… No interesse da miríades de homens e mulheres trabalhadores, cujas vidas são agora desnecessariamente afligidas e encurtadas pelo infinito sofrimento físico que seu mero emprego engendra, arrisco-me a expressar minha esperança de que as condições sanitárias do trabalho possam, universalmente, pelo menos até aqui, ser adequadas às disposições legais apropriadas.39

Isso, junto com outras questões mais abrangentes do agravamento das condições ecológicas das doenças geradas pelo sistema do capital, exigia, na visão de Marx, nada menos do que a reconstituição revolucionária da sociedade em geral: não apenas para o trabalho, mas também para a vida.

“As vinganças da natureza”

E. Ray Lankester, filho de Edwin Lankester, foi o principal zoólogo da Inglaterra na geração posterior a Darwin e Huxley. Ele era um materialista inflexível, socialista (do tipo fabiano) e crítico ambiental, que havia lido O capital, de Marx, e era um convidado frequente em sua casa.40 Lankester havia trabalhado na Alemanha com Ernst Haeckel. A primeira introdução da palavra ecologia ou œcologia (cunhada por Haeckel em 1866) no inglês apareceu na tradução de 1876 de History of Creation [História da Criação], de Haeckel, feita sob a supervisão de Lankester, que cunhou o termo bionomia, uma categoria que era comumente usada pela ecologia.41

Um dos principais aspectos da ampla pesquisa científica de Lankester foi o estudo de patógenos parasitas. Seu pai havia sido o editor fundador do Quarterly Journal of Microscopical Science, e Ray Lankester, posteriormente, tornou-se editor da publicação — que emergiu como o mais importante jornal científico britânico dedicado à pesquisa microbiana –, servindo ao posto por meio século. Em 1871, Lankester redescobriu, de forma independente (sua descoberta anterior, em 1843, havia passado despercebida), o Trypanosoma rotatorum, tipo de parasita microscópico em forma de saca-rolhas responsável por várias doenças do sono e pela doença de Chagas.42 Em 1882, “foi Lankester quem primeiro descreveu um protozoário parasita do tipo que, mais tarde, C. L. A. Laveran demonstrou ser o agente causador da malária”. O parasita, que Lankester chamou de Depranidium ranarum, foi renomeado Lankerstella em sua homenagem, em 1892.43

Para Lankester, “‘opostos’ aparentes são frequentemente aliados próximos na Natureza… A menor mudança na substância administrada ou a menor diferença na substância viva de um indivíduo … faz toda a diferença entre ‘veneno’ e ‘carne’”.44 Assim, alterações relativamente pequenas nas condições ecológicas resultantes do cruzamento de limiares críticos devido às ações humano-sociais poderiam alterar enormemente as relações ecológico-epidemiológicas, levando à disseminação de epidemias. Foi essa ampla perspectiva dialética e ecológica que fez de suas observações sobre o papel do homem na propagação das epidemias — além do próprio parasita patogênico — únicas em sua época.

Em 1887, Lankester visitou o Instituto Pasteur em Paris pela primeira vez, tornando-se um parceiro científico de Pasteur. Nos seus últimos anos, ele também trabalhou com Élie Metchnikoff, que sucedeu a Pasteur como chefe do instituto. Lankester foi a figura-chave que organizou a elite científica e política britânica para apoiar a pesquisa do Instituto Pasteur, preparando o cenário para o estabelecimento do Instituto Lister, seu semelhante na Inglaterra. Como diretor do Museu de História Natural de Londres, o principal centro zoológico da Inglaterra, Lankester estabeleceu importantes coleções de mosquitos e moscas tsé-tsé para pesquisas.45

Com a expansão do colonialismo e do imperialismo no final do século XIX, houve um enorme aumento das doenças tropicais, com destaque para a doença do sono africana (tripanossomíase), que devastou populações na África Central e Oriental, matando centenas de milhares de pessoas. O patógeno parasita foi disseminado pela mosca tsé-tsé. Uma vez que o parasita cruzasse a barreira hematoencefálica e afetasse o sistema nervoso central, o paciente tornava-se letárgico, insano, entrava em coma e morria.46 As potências europeias dividiram a África em 1884–1885, levando a uma extensão massiva de colonialismo e à pilhagem do continente. Quando os britânicos colonizaram Uganda, uma epidemia de doença do sono estourou, matando um terço da população em apenas alguns anos. Epidemias de Trypanosoma também eclodiram no Congo Francês, no Congo Belga e nas colônias da Alemanha e de Portugal.47

Como presidente do Comitê de Doenças Tropicais da Royal Society, bem como na qualidade de diretor do Museu Britânico de História Natural, Lankester dedicou muito de seus esforços na virada do século para pesquisar as fontes de doenças tropicais, particularmente a doença do sono. Os tripanossomos foram descobertos no sangue humano pela primeira vez em 1902. Lankester trabalhou em estreita colaboração com o microbiologista David Bruce, que foi o primeiro a determinar cientificamente que a doença do sono foi transmitida pela mosca tsé-tsé, a qual também transmitiu as variantes específicas do patógeno parasita que afetam os humanos (Trypanosoma brucei gambiense e Trypanosoma brucei rhodesiense).48

O aspecto mais notável do trabalho do próprio Lankester nessa área foi sua abordagem ecossocial à epidemiologia. Bruce tinha descoberto originalmente a espécie de tripanossomo protozoário (Trypanosome brucei) infectando gado doméstico, causando a mortal nagana. Essa espécie de tripanossomo, há muito, existia em uma relação benigna com animais selvagens, como búfalos, antílopes e gado selvagem. Tornou-se mortal apenas ao passar para o gado doméstico e para os humanos. Embora a doença do sono aparentemente estivesse presente em algum grau desde tempos imemoriais, as populações africanas haviam estabelecido uma espécie de equilíbrio entre os ecossistemas naturais/selvagens e aquele dos humanos e animais domésticos.49 O colonialismo destruiu tudo isso.

Lankester, escrevendo em “Nature’s Revenges: The Sleeping Sickness” [“A vingança da natureza: a doença do sono”], incluído em seu The Kingdom of Man [O reino dos homens], concluiu que a doença do sono “cresceu devagar nas rotas comerciais recém-abertas para a bacia do Congo” criadas pelos poderes coloniais. “A terrível mortalidade produzida por essa doença na África Central”, escreveu ele, “naturalmente causou a maior ansiedade” ao governo britânico, “que acabara de concluir a ferrovia da Costa Leste às margens do lago Victoria Nyanza”.50

Ao escrever sobre “Man and Disease” (“O homem e a doença”), em The Kingdom of Man, Lankester introduziu a hipótese de que,

no sistema extra-humano da Natureza, não há doenças e não há conjunção de formas de vida incompatíveis como as que o Homem trouxe à superfície do globo… É uma coisa notável — o que possivelmente pode ser uma verdade menos geral do que nosso conhecimento atual parece sugerir — que o ajuste dos organismos aos seus arredores é tão severamente completo na Natureza separada do Homem, que as doenças são desconhecidas, como fenômenos constantes e normais sob essas condições… Parece ser uma visão legítima a de que toda doença pela qual os animais (e provavelmente as plantas também) podem ser responsabilizados, exceto como uma ocorrência transitória e muito excepcional, se deva à interferência do homem. As doenças do gado, das ovelhas, dos porcos e dos cavalos não são conhecidas, exceto em rebanhos domesticados e entre aquelas criaturas selvagens às quais as produções domesticadas do Homem as comunicaram…

Qualquer coisa como as doenças epidêmicas de origem parasitária com as quais o homem civilizado está infelizmente familiarizado parece se dever à sua própria atividade inquieta e ignorante ou, na sua ausência, a grandes, e provavelmente um tanto repentinas, mudanças geológicas — mudanças nas conexões e, portanto, nas comunicações, de grandes áreas de terra… O homem tem causado estragos em si mesmo e em todos os outros tipos de seres ao misturar os produtos de uma área com os de outra… Em seus ávidos esforços para produzir grandes quantidades de animais e plantas convenientes aos seus propósitos, e em sua ânsia de reunir e organizar sua própria corrida por defesa e conquista, o homem acumulou enxames naturais de uma espécie em campos e fazendas e multidões não naturais de sua própria espécie em cidades e fortalezas. Essas massas não diluídas de um organismo servem como um campo fértil para a propagação de parasitas anteriormente raros e sem importância de um indivíduo para outro. As doenças epidêmicas humanas, bem como as do gado e das plantações, são, em grande parte, devido a essa ação imprudente do homem não científico.51

Epidemias em humanos (bem como em seus animais e plantas domesticados) resultaram da destruição ecológica e das vastas aglomerações de espécies humanas e de seus animais domesticados, incluindo monoculturas e currais de engorda de animais, que criaram caminhos para patógenos. Essas doenças comumente surgiram do vazamentos de patógenos de hospedeiros naturais, entrando em animais domesticados e humanos, devido às perturbações causadas pelas ações humanas.52 E com a biodiversidade diminuída e, em muitos casos, eliminada, a disseminação de doenças ocorreu muito mais prontamente. Além disso, causas socioeconômicas definidas engendraram essas mudanças, relacionadas à expansão colonial e à globalização do capitalismo, e tendo a ver com um sistema dominado por “mercados” e “comerciantes financeiros cosmopolitas”.53

Como Lankester escreveu em “Nature’s Revenges: The Sleeping Sickness”:

Temos justificativa para acreditar que, até que o homem introduzisse suas raças de gado e cavalo artificialmente selecionadas e transportadas para a África, não havia doença de nagana [animais domésticos infectados com tripanossoma]. O Trypanosoma brucei vivia no sangue de caças de grande porte em perfeita harmonia com seu hospedeiro. Da mesma forma, é provável que o parasita da doença do sono tenha florescido inocentemente por meio de um estado de adaptação causado pela tolerância por parte dos homens aborígenes e animais da África Ocidental. Apenas quando os caçadores de escravos árabes, os exploradores europeus e os ladrões de borracha da Índia agitaram as populações tranquilas da África Central, e misturaram com sua violência os suscetíveis às raças tolerantes, que o parasita da doença do sono se tornou um flagelo mortal — um “desarmonia” para usar o sugestivo termo introduzido por minha amiga [Élie Metchnikoff].54

Lankester passou a insistir na necessidade de expansão da saúde pública na tradição de Simon, transcendendo a tendência capitalista de organizar a medicina “como uma profissão remunerada”.55 Somente com o envolvimento coordenado do Estado a saúde e a segurança da população humana poderiam ser asseguradas.

A segunda doença

Apesar do predomínio do modelo biomédico, com seu foco estreito na saúde individual privada, persistiu uma concepção mais abrangente da medicina socializada, enraizada em uma compreensão holística do ambiente socioeconômico e físico. Contribuições significativas para essa abordagem ambiental vieram de Du Bois, Hamilton, Bethune e Allende, cada um dos quais explorou como a organização e as operações da economia política contribuíram tanto para a desigualdade quanto para a disseminação de doenças. Bethune descreveu esse aspecto como a “segunda doença”, que precisava ser reconhecida como um “crime social”, semelhante ao conceito de assassinato social de Engels.56

Em The Health and Physique of the Negro American [A saúde e a psique do negro americano] (1906), Du Bois demonstrou como lidar com questões epidemiológicas envolvia confrontar concepções raciais, especialmente no que diz respeito às noções biológicas sobre habilidades e disposições inatas. Ele pesquisou os estudos mais recentes em antropologia e várias ciências biológicas, os quais determinavam que era “impossível traçar uma linha de cor entre os negros e outras raças” no que diz respeito às “características físicas”; portanto, os negros “não podem ser destacados… como absolutamente diferentes”.57 Em particular, ele estava desafiando os estudos de antropometria craniana, como aqueles associados ao médico francês Paul Broca, em meados de 1800, que mediam e pesavam cérebros humanos em um esforço para proclamar origens evolutivas distintas entre os povos do mundo. Du Bois enfatizou os diversos problemas com esses estudos, como o número insuficiente de cérebros de negros em comparação aos de brancos e a não consideração de características sociodemográficas, como idade, classe, ocupação e nutrição.

Para demonstrar as causas sociais das doenças, Du Bois apresentou uma série de casos e situações comparativas para iluminar as diferenças em saúde e doença. Isso revelou a fraqueza do argumento de que “negros são inerentemente inferiores em físico aos brancos”.58 Ele detalhou como a taxa de mortalidade de negros na Filadélfia, embora alta em relação aos brancos, era menor do que a de brancos em muitas outras áreas do país, indicando que outros fatores estavam envolvidos além da chamada raça biológica — particularmente as relações sociais de raça e classe. Para que não fosse possível ser mais claro, Du Bois apontou que, no início do século XX, na Rússia, onde a divisão entre aristocracia/burguesia e camponeses/proletários era especialmente gritante, “a taxa de mortalidade da pobreza” revelava “uma divergência muito maior da taxa entre os ricos do que a diferença entre negros e brancos da América”. Resultados semelhantes estavam presentes em relação à Grã-Bretanha, à Suécia e à Alemanha, onde a taxa de mortalidade dos pobres era duas vezes maior que a dos ricos, com os “bem de vida” entre os dois grupos. Os brancos que trabalhavam nos currais de Chicago tinham uma taxa de mortalidade mais alta do que os negros na cidade.

Ao destacar esses fatos, Du Bois estava argumentando contra os argumentos deterministas enraizados na raça biológica. Em resposta, ele apontou para formas entrelaçadas de opressão. A alta mortalidade infantil, as doenças e a taxa de mortalidade em geral refletiam uma “condição social” global, abrangendo moradias precárias, água contaminada, falta de ventilação, nutrição inadequada, poluição do ar e empregos perigosos — todos ligados às desigualdades de raça (como categoria cultural) e classe.59 “A tuberculose”, insistiu ele, “não é uma doença racial, mas social”.60

Décadas depois, em 1947, o principal biólogo britânico e teórico marxista J. B. S. Haldane escreveu que a tuberculose estava intimamente ligada a fatores econômicos, principalmente ganhos reais, “com as duas curvas”, dos ganhos reais de mulheres jovens na Inglaterra e de suas taxas de mortalidade por tuberculose, “Quase idênticas uma à outra de cabeça para baixo” — uma relação que se poderia esperar que se aplicasse a outros grupos oprimidos.61

Olhando para o fato de que as disparidades de saúde entre negros e brancos não eram de forma alguma corrigidas, mas diferiam de acordo com classe e localidade, Du Bois apresentou uma refutação definitiva da tese da inferioridade racial em relação aos negros americanos proposta pelo eugenista Frederick Hoffman em seu Race Traits and Tendencies in the American Negro [Características de raça e tendências no negro americano] (1896). Hoffman afirmou que as estatísticas de saúde demonstraram que a suscetibilidade dos negros “apenas à tuberculose seria suficiente para selar seu destino como raça”.62 Ao que Du Bois respondeu:

O fato inegável é… que em certas doenças os negros têm uma taxa muito maior do que os brancos, principalmente em tuberculose, pneumonia e doenças infantis.

A questão é: isso é racial [em termos de raça biológica]? O Sr. Hoffman nos levaria a dizer que sim, e a inferir que isso significa que os negros são inerentemente inferiores em físico aos brancos.

Mas a diferença na Filadélfia pode ser explicada por outros motivos além da raça. A alta taxa de mortalidade de negros da Filadélfia é ainda menor do que a dos brancos de Savannah, Charleston, Nova Orleans e Atlanta.63

A crítica incisiva de Du Bois à “má avaliação do homem” com respeito à saúde da população negra nos Estados Unidos aparentemente teve um efeito poderoso. John William Trask, cirurgião-geral assistente do Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos, escreveu um artigo em 1916 para o American Journal of Public Health sobre raça e saúde que estava em oposição diametral à edição especial sobre “A saúde do negro” do mesmo jornal, do ano anterior, focalizando como Du Bois o papel da classe e dos fatores econômicos, e rejeitando uma interpretação dos resultados de saúde com base na raça biológica.64

No início do século XX, a médica e (assim como Kelley) residente da Hull House Alice Hamilton produziu um trabalho inovador investigando o que Marx, inspirado por Ramazzini, chamou de “patologia industrial” ou saúde ocupacional e ambiental. Na época, a medicina industrial não estava bem estabelecida nos Estados Unidos, havia poucos dados. Os médicos e chefes de empresa atribuíam doenças e ferimentos de trabalhadores à saúde precária, sugerindo que eles tinham constituição fraca e que lhes faltava higiene. Hamilton desmantelou sistematicamente esses argumentos por meio de suas extensas investigações sobre as condições de trabalho. Ela conduziu estudos detalhados do processo de trabalho em inúmeras fábricas, examinando as condições, produtos químicos e materiais usados na produção, os pontos de exposição e as doenças vivenciadas pelos trabalhadores.65

Em 1908, Hamilton observou que os Estados Unidos estavam tão obcecados com a expansão da produção industrial que haviam falhado em “fazer um balanço dos mortos e dos feridos” nessas operações.66 Ela fez uma distinção entre negócios que são inerentemente perigosos por envolverem substâncias venenosas e aqueles que são perigosos devido às más condições de trabalho. Ambos os reinos exigiam atenção especial, pois contribuíam de maneiras distintas para a ruptura corpórea nos corpos humanos e entre as populações divididas por classe, raça e gênero.

Por meio de inspeção de fábricas, entrevistas extensas e coleta de dados sobre envenenamento, Hamilton documentou distúrbios tóxicos associados com — mas não limitados a — mercúrio, arsênio, fósforo, corantes de anilina, benzeno, rádio e chumbo. Ela revelou como o chumbo foi amplamente utilizado na indústria, resultando em envenenamento por chumbo entre os trabalhadores, afetando negativamente o sistema nervoso. Nas mulheres, essa exposição estava associada a abortos espontâneos. Ela explicou que os sintomas de envenenamento por chumbo geralmente não se manifestavam até que a situação fosse bastante grave. Além disso, a exposição poderia ocorrer em várias frentes. Nas fábricas que usavam sais de chumbo, os trabalhadores inalavam esse material porque era parte da poeira no ar. Assim, era necessário dar conta dos aspectos temporais e dos vários caminhos da ecologia da doença.67 Com base em suas pesquisas sobre os perigos da exposição ao chumbo, ela alertou, em 1925, contra o uso do chumbo na gasolina, observando que apresentava um perigo para o público e para o meio ambiente.

Em sua investigação da indústria da borracha, que ainda estava em seus estágios iniciais, Hamilton afirmou: “Não foi fácil garantir as informações desejadas, uma vez que a natureza dos produtos químicos usados ​​na composição e aproveitamento da borracha é cuidadosamente protegida como um valioso segredo comercial, enquanto as doenças ocupacionais entre os trabalhadores da borracha muitas vezes chegam ao conhecimento do médico da empresa, que considera um dever para com seus empregadores manter tais ocorrências em segredo”.68 Esses segredos comerciais atrasaram o diagnóstico do motivo pelo qual os trabalhadores estavam desenvolvendo cianose, fazendo com que seus lábios ficassem azuis. Eventualmente, descobriu-se que todos esses trabalhadores manipulavam anilina. Ela também destacou um solvente, o dissulfeto de carbono, usado na fabricação de borracha, que afetava o sistema nervoso central. Os trabalhadores o inalavam e o absorviam pela pele. Pessoas afetadas desenvolviam dores de cabeça extremas, fadiga, depressão e problemas para caminhar. Dada a exposição a tantos produtos químicos tóxicos diferentes, Hamilton enfatizou que os hospitais, incluindo asilos, precisavam documentar a ocupação dos pacientes, a fim de determinar a fonte potencial das doenças, em vez de tratar essas situações como casos isolados.69

Devido à divisão do trabalho baseada em gênero, as mulheres experimentaram várias doenças associadas às suas condições de trabalho específicas. Hamilton observou que, nas fábricas têxteis, as trabalhadoras sofriam de doenças pulmonares devido à inalação de partículas de algodão e lã. Junto com John B. Andrews, ela detalhou como as mulheres que trabalhavam em fábricas de fósforos estavam sofrendo de necrose de fósforo devido à exposição ao fósforo branco. Hamilton demonstrou que eram as condições sociais que concentravam doenças e enfermidades específicas na população. Desigualdades sociais, como aquelas associadas à divisão do trabalho em relação a mulheres e imigrantes, resultaram em diferentes exposições a venenos e trabalhos perigosos.

Bethune, um médico canadense que atuou como cirurgião na Guerra Civil Espanhola e, mais tarde, na Revolução Chinesa, argumentou, em 1936, na conferência da Sociedade Médico-Cirúrgica de Montreal, que o capitalismo “produz doenças” e que seu sistema médico é dominado pelo “individualismo voraz”, por meio do qual os médicos “enriquecem às custas das misérias de nossos semelhantes”.70 Ele havia conseguido se recuperar desde o início de uma tuberculose. Ao conversar com médicos radicais que fizeram parte das forças de libertação na China em 1939, ele declarou: “Como médico, sofri de duas doenças muito difíceis. Eu estava apenas começando a progredir como cirurgião quando fui vítima de um forte caso de tuberculose… Minha ‘segunda doença’… bem, isso não era tão simples… Eu vim a entender que a tuberculose não era apenas uma doença, mas um crime social… Eu aprendi o que deve ser feito para curar essa segunda doença”.71

Segundo Bethune, a maioria do público em uma sociedade capitalista recebia pouco ou nenhum atendimento médico a cada ano, simplesmente porque não tinha condições de pagá-lo. A medicina havia se tornado uma mercadoria de luxo, na qual os médicos “vendem pão a preço de joias”.72 Pessoas sofreram e morreram desnecessariamente sob esse arranjo. Ele declarou que a saúde privada não fazia sentido sob o capitalismo industrial. Em vez disso, “toda saúde é saúde pública”.73 Ele continuou a insistir que a “medicina socializada” era necessária, o que significa que “a proteção da saúde torna-se propriedade pública”, “é mantida por fundos públicos”, o “serviço está disponível para todos”, “os trabalhadores devem ser pagos pelo Estado”, e há um “autogoverno democrático dos próprios trabalhadores da saúde”.74 Como parte dessa transformação, ele apresentou uma compreensão da ecologia da doença:

Qualquer esquema para curar essa doença que não considere o homem como um todo, como resultado da tensão e do estresse ambientais, está fadado ao fracasso. A tuberculose não é apenas uma doença pulmonar; é uma mudança profunda em todo o corpo que ocorre quando o homem, considerado como um organismo que age sob as ordens e é um produto de seu ambiente, falha em circunavegar ou subjugar certas forças prejudiciais que atuam em seu corpo e mente. Deixe-o persistir em continuar em tal ambiente e ele morrerá. Mude esses fatores, tanto externos quanto internos, reajuste a cena — senão o palco –, e ele, na maioria das vezes, se recuperará.75

Bethune ilustrou como as mudanças ambientais já estavam sendo praticadas pelos ricos que tinham tuberculose, que iam para os sanatórios para descansar, comer alimentos nutritivos e desfrutar de ar puro. Os pobres, ao contrário, no sistema atual, morriam por falta de tratamento e atendimento adequado. Com a medicina socializada e um sistema socioeconômico baseado no atendimento e no serviço das necessidades humanas, a abrangente variedade das relações socioecológicas poderia ser atendida, como parte da erradicação da segunda doença: o assassinato social instituído pelas relações capitalistas de produção.

Em consonância com essa visão, Bethune dedicou sua vida a lutar por esse futuro. Após sua morte por envenenamento do sangue, em 1939, depois de operar um soldado chinês ferido, Mao Zedong escreveu de forma comovente: “O camarada Bethune era um médico, a arte de curar era sua profissão e ele estava constantemente aperfeiçoando suas habilidades”, ele personificava um “verdadeiro espírito comunista” e demonstrou uma completa “devoção aos outros… Estou profundamente triste por sua morte”. Ele era “um homem de… valor para o povo”.76

Em 1939, mesmo ano da morte de Bethune na China, Allende escreveu seu clássico trabalho epidemiológico, The Chilean Medico-Social Reality [A realidade médico-social chilena], enquanto servia como ministro da Saúde no governo da Frente Popular chefiado por Pedro Aguirre Cerda. Allende explicou: “O indivíduo na sociedade não é uma entidade abstrata; nasce, desenvolve-se, vive, trabalha, reproduz, adoece e morre em estrita sujeição ao meio ao seu redor, cujas diferentes modalidades criam diversos modos de reação, frente aos agentes etiológicos da doença. O ambiente material é determinado por salários, nutrição, habitação, vestuário, cultura e outros fatores concretos e históricos”.77 Allende, como Du Bois e Bethune, caracterizou a tuberculose como uma “doença social” por sua incidência muito maior entre as populações trabalhadoras. Ele viu doenças como o tifo como manifestações da proletarização e da pauperização. Como escreveu Howard Waitzkin, “a exposição de Allende dos fatores sociais na etiologia das doenças infecciosas antecedeu muitas ênfases da epidemiologia moderna. Seus argumentos transcenderam a busca por agentes etiológicos e tratamentos específicos — a perspectiva dominante da medicina ocidental na época em que Allende estava escrevendo”.78

Assim como Marx, Allende se referiu às doenças ocupacionais como uma “patologia social” promovida pela industrialização capitalista. Ele ressaltou as deficiências da medicina ocidental, que a levaram a ignorar quase completamente o papel das doenças ocupacionais, resultando na escassez de informações sobre o assunto.79

Allende estava particularmente preocupado com os efeitos do imperialismo na limitação da medicina social na América Latina e em todo o Terceiro Mundo. Ele foi talvez o primeiro crítico da indústria farmacêutica como representante da dominação da saúde pelo capital monopolista e pelas forças imperialistas. Ele destacou os preços muito mais altos dos produtos farmacêuticos de marca e a propaganda enganosa das principais empresas farmacêuticas multinacionais. Depois de ser eleito presidente do Chile no governo de Unidade Popular, em 1970, ele promoveu a nacionalização da indústria farmacêutica, que era controlada por estrangeiros internacionais, e buscou o controle dos preços dos medicamentos.80

O capitalismo contra a epidemiologia ecossocialista

A morte de Allende, em 1973, durante o golpe chileno lançado por Augusto Pinochet e apoiado pelos Estados Unidos, marcou, simultaneamente, não só o fim de uma das grandes experiências socialistas e o lançamento do neoliberalismo pela ditadura militar de Pinochet em cooperação com economistas de Chicago liderados por Milton Friedman; mas também representou a perda em Allende de uma das grandes figuras da medicina social. Em nenhum lugar o neoliberalismo teve efeitos mais devastadores do que na destruição das iniciativas de saúde pública e medicina social em todo o mundo.81

A ascensão radical da década de 1970, no entanto, levou a avanços importantes na epidemiologia social, o que continuou na década de 1980, fundindo-se com perspectivas ecológicas na década de 1990. Isso serviu para revigorar e expandir a perspectiva dialética de Airs Waters Places sobre a incorporação da humanidade a seu ambiente como um todo, há muito promovida por pensadores materialistas e socialistas. Assim, a perspectiva epidemiológica capitalista dominante, baseada em fatores biomédicos e estilo de vida, foi cada vez mais desafiada a partir dos anos 1970 por uma abordagem que enfatizava “a teoria ecossocial da distribuição de doenças: incorporando o contexto social e ecológico”.82 Esses anos viram a ascensão do materialismo histórico dialético no trabalho de figuras radicais, como Hilary e Steven Rose, engajados nos movimentos de “ciência para o povo” nos Estados Unidos e no Reino Unido, incorporando noções de “epidemiologia materialista”, “economia política da saúde” e “etiologia social da doença”.83 Como exemplos desses novos desenvolvimentos revolucionários, Barbara e John Ehrenreich publicaram The American Health Empire [O império americano da saúde], em 1970; Vicente Navarro fundou o principal órgão crítico da medicina social, The International Journal of Health Services, em 1971; Barbara Ehrenreich e Deirdre English finalizaram Witches, Midwives and Nurses [Bruxas, parteiras e enfermeiras], em 1973; Lesley Doyal escreveu The Political Economy of Health [A economia política da saúde], em 1979; Waitzkin terminou The Second Sickness [A segunda doença], em 1983; Levins e Richard Lewontin publicaram The Dialectical Biologist [O biólogo dialético], em 1985; e David Himmelstein e Steffie Woolhandler cofundaram o Physicians for a National Health Program, em 1987 (um ano depois de coeditar uma edição especial da Monthly Review sobre “Ciência, tecnologia e capitalismo”).84

Na década de 1990, essas perspectivas críticas sobre medicina, saúde e doença se fundiram às novas abordagens de orientação ecológica, marcadas especialmente pela “teoria ecossocial da distribuição de doenças”, de Nancy Krieger, na qual ela incorporou “construtos relativos a economia política, ecologia política, ecossistemas, escalas e níveis espaço-temporais, caminhos biológicos de incorporação e produção social de conhecimento científico”, a fim de transcender o estreito modelo biomédico de saúde e doença favorável ao capital.85 Essa abordagem ecossocial está alinhada com a longa história da ecologia humana, refletida no trabalho do biólogo histórico-materialista Lancelot Hogben, na década de 1930, com sua ênfase holística no “sistema ecológico do homem”.86

Em Biology Under the Influence [Biologia sob influência] (2007), Lewontin e Levins criticaram diretamente o extremo reducionismo do projeto do genoma humano, que assume que a doença pode ser combatida com genes projetados, sem levar em conta a “hélice tripla” representada pela dialética entre gene, organismo e meio ambiente.87 Fantasias reducionistas semelhantes surgiram com aqueles que acreditavam que os antibióticos poderiam curar todas as infecções bacterianas, sem entender que as bactérias, como organismos vivos, evoluem e sofrem mutações, negando as ações de antibióticos específicos. O uso excessivo de antibióticos sob o capitalismo, particularmente nos currais de engorda em grande escala do agronegócio e nas fábricas de frangos, onde os antibióticos são usados para combater doenças bacterianas associadas à superlotação, resultou na rápida evolução de bactérias resistentes a antibióticos, ou “superbactérias”, ameaçando a população humana — produzindo uma nova instância do que Lankester (após Engels) descreveu como “Vinganças da Natureza”.88

Para Levins, escrevendo em “Is Capitalism a Disease?” [“O capitalismo é uma doença?”], as cinco respostas sociais primárias à crise de saúde moderna requerem foco em: 1) saúde do ecossistema; 2) justiça ambiental; 3) determinação social da saúde; 4) atenção à saúde universal; e 5) medicina alternativa.89 A isso deve ser adicionada, sempre que possível, uma abordagem ecossocial para a pesquisa científica em medicina. O país que melhor exemplifica essa abordagem social da saúde é Cuba, onde todos esses fatores são levados em consideração. Apesar de ser um país pequeno e pobre, confrontado por um bloqueio econômico instituído pelos Estados Unidos, Cuba emergiu como líder mundial em biotecnologia; por exemplo, é o único país da América Latina a desenvolver vacinas para a covid-19.90 Isso se deve à sua abordagem socialista e ecológica, que vê a saúde como um fator produtivo básico, onde o “capital humano” total importa, ao invés de ser simplesmente designado como um atributo dos indivíduos, mediado pela posição de classe. Cuba adotou, portanto, um modo de pesquisa científica inteiramente diferente, que se baseia na noção do conhecimento como coletivo, interdisciplinar, concreto, local e frequentemente tácito. Isso, conforme explicado por Agustín Lage Dávila, diretor do Centro de Imunologia Molecular de Havana, vai contra as abordagens individualistas, reducionistas, não localizadas e extra-ambientais dominantes, características do modelo capitalista de investigação científica dominante.91

Com o início da pandemia de covid-19, a importância da epidemiologia histórico-materialista tornou-se cada vez mais evidente, como no trabalho de Rob Wallace, autor de Big Farms Make Big Flu [Fazendas grandes criam gripes grandes] e Dead Epidemiologists [Epidemiologistas mortos].92 Para Wallace e epidemiologistas associados à Saúde Única Estrutural (uma variante ecossocial mais crítica da agora dominante abordagem Saúde Única, adotada pela Organização Mundial da Saúde), a chave é entender como a nova onda de epidemias mortais está conectada não a “geografias absolutas”, mas aos circuitos de capital introduzidos pela globalização neoliberal. Isso inclui a destruição de ecossistemas e a aglomeração de vastas monoculturas de espécies únicas, particularmente em currais de engorda de animais. Tudo isso incentiva a propagação de doenças zoonóticas entre animais domesticados e humanos, transmitidas ao longo dos circuitos de capital, gerando o que foi chamado de “blowback ecológico”. A extensão das cadeias de commodities capitalistas e a demolição neoliberal dos sistemas de saúde pública aumentaram a velocidade com que as doenças se espalham globalmente, ao mesmo tempo que tornaram as populações — especialmente as pobres e racialmente oprimidas — mais vulneráveis.93

Conforme explicado por Wallace, “o capitalismo não se trata apenas de produzir rupturas metabólicas entre nossas economias e ecologias em direção ao lucro, destruindo nossa capacidade de reprodução como civilização. Trata-se também de produzir novas ecologias que reproduzem o capital alienando a teia da vida”.94 Uma visão semelhante é defendida pelo economista marxista e kaleckiano Riccardo Bellofiore, que afirmou vigorosamente: “A raiz subterrânea” da atual crise do coronavírus, em seus múltiplos aspectos econômicos, epidemiológicos e ecológicos, reside no “roubo e destruição sistemáticos do que é ‘outro’ para o capital… Tanto a natureza ‘externa’ quanto os seres humanos como parte da natureza, em sua interação dialética”, estão, agora, sujeitos a esse sistema de alienação universal. Isso levou, no momento presente, a “um exemplo particularmente dramático e explícito de perda do controle do metabolismo entre a natureza e a intervenção humana”.95

Hoje, a noção de que os seres humanos podem ser concebidos separadamente de seu ambiente como um todo tem se mostrado um dos erros mais fatais da longa história da humanidade. O retorno a uma perspectiva dialética da humanidade e da natureza — rastreável até os gregos antigos e as noções de Airs Waters Places, e preservada e aprimorada ao longo de milênios pelo trabalho de pensadores materialistas, socialistas e ecológicos — é um requisito existencial para viver ecologicamente no Antropoceno, em um mundo além do capital.

Notas

  1. Friedrich Engels, Do socialismo utópico ao socialismo científico. Nova York: International Publishers, 1978, 45.
  2. Autor hipocrático, Airs, Waters, and Places. Disponível em: classics.mit.edu. Ver também Hippocratic Writings. Londres: Penguin, 1950. No texto, acompanhamos Benjamin Farrington, referindo-se ao título Airs Waters Places. Ver Benjamin Farrington, Head and Hand in Ancient Greece. Londres: Watts and Co., 1947, 39.
  3. Charles E. Rosenberg, “Epilogue: Airs, Waters, Places”, Bulletin of the History of Medicine, 86, 2012, 661; Nancy Krieger, Epidemiology and the People’s Heath. Oxford: Oxford University Press, 2011, vii-xi.
  4. Farrington, Head and Hand in Ancient Greece, 35.
  5. Karl Marx, O capital, v. 1. Londres: Penguin, 1976, 484–85.
  6. Ramazzini citado em Farrington, Head and Hand in Ancient Greece, 38; J. S. Felton, “The Heritage of Bernardino Ramazzini”, Occupational Medicine, 47, n. 3,1997, 167–79. Para uma tradução recente, ver Bernardino Ramazzini, Diseases of Workers. Thunder Bay, Ontario: OH&S Press, 1993, 42.
  7. Paul de Kruif, The Microbe Hunters. San Diego: Harvest, 1996.
  8. Nancy Krieger apresentou o conceito específico “ecossocial” às ciências da saúde em 1994, como parte de sua “teoria ecossocial da distribuição da doença”, dando destaque ao termo. Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 202–3, 213.
  9. Abdel R. Omran, “The Epidemiologic Transition”, Milbank Quarterly, 49, n. 4, part 1, 1971, 509–38. A noção de uma transição epidemiológica, é claro, teve uma história mais longa, anterior à própria formulação do termo. Ver, por exemplo, H. G. Wells, Julian S. Huxley e G. P. Wells, The Science of Life. Nova York: Literary Guild, 1934, 1089–90.
  10. John W. Sanders, Greg S. Fuhrer, Mark D. Jonson e Mark S. Riddle, “The Epidemiological Transition: The Current Status of Infectious Diseases in the Developed World versus the Developing World”, Science Progress, 9, n. 2, 2008, 1–38; M. H. Wahdan, “The Epidemiological Transition”, La Revue de Santé de la Méditerranée Orientale, 2, n. 1,1996, 8–20; Frank M. Snowden, “Emerging and Reemerging Diseases: A Historical Perspective”, Immunological Review, 225, n. 1, 2008, 9–26.
  11. Richard Levins, “Is Capitalism a Disease?”, Monthly Review, 52, n. 4, set. 2000, 11. Também incluído como um capítulo em Biology Under the Influence, de Richard Lewontin e Richard Levins (Nova York: Monthly Review Press, 2007, 297–319).
  12. John Bellamy Foster, The Return of Nature. Nova York: Monthly Review Press, 2020, 173–74, 183–84.
  13. George Eliot, Middlemarch. Nova York: Signet, 1981, 143–44.
  14. Michael E. Rose, “The Doctor in the Industrial Revolution”, British Journal of Industrial Medicine, 28, 1971, 22–26; Ronald Meek, Economics, Ideology, and Other Essays. Londres: Chapman and Hall, 1967, 34–50.
  15. Henry Julian Hunter, Formerly of Sheffield”, British Medical Journal, 1 ago. 1908.
  16. Foster, The Return of Nature, 28–29.
  17. Edward Smith, Health and Disease. Londres: Walton and Maberly, 1861; Encyclopedia.com, s.v. “Smith, Edward”, acesso em: 27 abr. 2021.
  18. Karl Marx e Friedrich Engels, Collected Works, v. 4. Nova York: International Publishers, 1975, 403–6.
  19. Marx e Engels, Collected Works, v. 4, 361–62, 389–92.
  20. Marx e Engels, Collected Works, v. 4, 394, 407; Foster, The Return of Nature, 184, 196.
  21. Howard Waitzkin, The Second Sickness. Nova York: Free Press, 1983, 60–63; Foster, The Return of Nature, 212–15; Brett Clark e John Bellamy Foster, “Florence Kelley and the Struggle Against the Degradation of Life”, Organization & Environment, 19, n. 2, 2006, 251–63.
  22. Lancelot Hogben, Science for the Citizen. Nova York: Alfred A. Knopf, 1938, 875.
  23. Marx, O capital, v. 1, 348–49; Karl Marx, O capital, v. 3. Londres: Penguin, 1981, 949. A observação de Marx relacionando o comércio de guano e as epidemias periódicas como igualmente representativos da ruptura metabólica prefigurou a análise de Lancelot Hogben, que encerrou um capítulo sobre “Os caçadores de micróbios” em Science for the Citizen com uma discussão sobre o comércio de guano como um exemplo de perturbação do ciclo do nitrogênio e suas implicações para a agricultura, vendo claramente esses distúrbios de substâncias naturais como “as loucuras de uma jovem civilização”. Ver Hogben, Science for the Citizen, 877–79.
  24. Sobre o conceito de ruptura corpórea, ver John Bellamy Foster e Brett Clark, The Robbery of Nature. Nova York: Monthly Review Press, 2020, 23–32.
  25. Sobre John Simon e sua influência em Marx e Engels, ver Foster, The Return of Nature, 1990–212.
  26. Marx, O capital, v. 1, 812.
  27. John Simon, English Sanitary Institutions. Londres: Smith, Elder, Co., 1897, 437–39, 443–45, 455–58, 480–81; Foster, The Return of Nature, 199–204, 208, 211–12, 573.
  28. Marx, O capital, v. 1, 812–13, 834–35.
  29. Henry Julian Hunter, apêndice 2 para “Report on the Housing of the Poorer Parts of the Population in Towns”, em Medical Officer of the Privy Council, Eighth Public Health Report, 1865. Londres: Her Majesty’s Government, 1866, 89. Marx e Engels, Collected Works, v. 35, 654; Marx, O capital, v. 1, 814–15. A edição da Penguin de O capital é deficiente aqui, já que uma parte crucial da frase de Hunter, relacionada ao capital, está faltando.
  30. Marx, O capital, v. 1, 635–36, 818.
  31. Marx, O capital, v. 1, 818–20.
  32. Marx, O capital, v. 1, 846.
  33. Marx, O capital, v 1, 723–24.
  34. Marx, O capital, v. 1, 822.
  35. Edward Smith, apêncide 6 para Medical Officer of the Privy Council, Sixth Public Health Report, 1863. Londres: Her Majesty’s Government, 1864, 238, 249, 261–62; Karl Marx, On the First International. Nova York: McGraw-Hill, 1973, 5–7; Marx, O capital, v. 1, 834–35; Foster e Clark, The Robbery of Nature, 107–8.
  36. Henry Julian Hunter, apêndice 14 para “Report on the Excessive Mortality of Infants in Some Districts of England”, em Sixth Public Health Report, 1863, 453–59; Marx, O capital, v. 1, 520–22, 835–36; Foster e Clark, The Robbery of Nature, 84–85.
  37. Uma década antes, Edwin Lankester, como oficial médico da paróquia de St. James, junto com o Dr. John Snow e o reverendo Henry Whitehead, descobriu que a origem da epidemia de cólera de 1854, em Londres, era a bomba d’água da Broad Street nas proximidades, demonstrando que a cólera era uma doença transmitida pela água — uma importante descoberta que levou à teoria dos germes da doença. Ver Foster, The Return of Nature, 29–31, 37.
  38. Marx, O capital, v. 1, 364–67.
  39. John Simon em Sixth Public Health Report, 1863, 29–31; Marx, O capital, v. 1, 594; Marx, O capital, v. 3, 190. Esta passagem de John Simon está cheia de citações erradas em todas as edições de O capital em inglês. Parece ter sido traduzido de volta do alemão para o inglês, em vez de usar o inglês original. Aqui citamos a partir do original.
  40. Marx e Lankester eram amigos próximos nos últimos anos da vida do segundo. Marx estava interessado na obra Degeneration, de Lankester, que abordava o parasitismo. Ver E. Ray Lankester, Degeneration. Londres: Macmillan and Co., 1880. Lankester recebeu sua cópia de O capital diretamente de Marx. Ver Foster, The Return of Nature, 27, 35–40.
  41. Para análise das realizações de Lankester, ver Foster, The Return of Nature, 24–72; Joseph Lester, Ray Lankester and the Making of Modern British Biology. Oxford: British Society for the History of Science, 1995.
  42. Ray Lankester, “On Undulina, the Type of a New Group of Infusoria”, Quarterly Journal of Microscopical Science, 11, 1971, 387–89; Lester, E. Ray Lankester, 149; E. Ray Lankester, The Kingdom of Man. Nova York: Henry Holt and Co, 1911, 173–74.
  43. Ray Lankester, “On Drepanidium Ranarum, the Cell-Parasite of the Frog’s Blood and Spleen”, Quarterly Journal of Microscopic Science XXII, 1882, 53–65; Lester, E. Ray Lankester, 147–48.
  44. Ray Lankester, Science from an Easy Chair: Second Series. Londres: Methuen and Co., 2015, 353.
  45. Ray Lankester, prefácio à Olga Metchnikoff, Life of Elie Metchnikoff, 1845–1916. Boston: Houghton Mifflin, 1921, vii-viii; E. Ray Lankester, The Advancement of Science. Londres: Macmillan and Co., 1890, 148, 150, 164–65.
  46. Lankester, The Kingdom of Man, 161, 166–67; Daniel R. Headrick, “Sleeping Sickness Epidemics and Colonial Responses in East and Central Africa, 1900–1940”, PLOS Neglected Tropical Diseases, 8, n. 4, 2014; Maryinez Lyons, “Sleeping Sickness in the History of the Northeast Congo (Zaire)”, Canadian Journal of African Studies, 19, n. 3, 1985, 627–33; Gerasimos Langousis e Kent L. Hill, “Motility and More: The Flagellum of Trypanosoma brucei”, Nature Reviews Microbiology, 12, n. 7, 2014, 505–18.
  47. Headrick, “Sleeping Sickness Epidemics”.
  48. Lankester, The Kingdom of Man, 165–66, 175, 189; Lester, Ray Lankester, 148–50.
  49. Lankester, The Kingdom of Man, 145, 165–71; Headrick, “Sleeping Sickness Epidemics”.
  50. Lankester, The Kingdom of Man, 160–61.
  51. Lankester, The Kingdom of Man, 32–33, 185–87.
  52. Lankester, Science from an Easy Chair, 343–44.
  53. Lankester, The Kingdom of Man, 31–33; Lester, Ray Lankester, 190.
  54. Lankester, The Kingdom of Man, 189.
  55. Lankester, The Kingdom of Man, 191.
  56. Norman Bethune citado em The Scalpel, The Sword, por Sydney Gordon e Ted Allan (Nova York: Monthly Review Press, 1973, 250).
  57. E. B. Du Bois, The Health and Physique of the Negro American. Atlanta: Atlanta University Press, 1906, 16. Ver Stephen Jay Gould, The Mismeasure of Man (Nova York: W. W. Norton & Company, 1996), para uma importante crítica dos diversos vieses, conscientes e inconscientes, que influenciaram Broca e outros. O paralelo entre as críticas de Du Bois e Gould é fascinante.
  58. Du Bois, The Health and Physique of the Negro American, 24–25, 89.
  59. Du Bois, The Health and Physique of the Negro American, 89–90; W. E. B. Du Bois, The Philadelphia Negro. Filadélfia: Ginn & Co., 1899, 147–63.
  60. Du Bois, The Health and Physique of the Negro American, 89.
  61. B. S. Haldane, Science Advances. Londres: George Allen and Unwin, 1947, 153–57.
  62. Frederick L. Hoffman, Race Traits and Tendencies of the American Negro. Nova York: American Economic Association, 1896, 148; Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 109–10.
  63. Du Bois, The Health and Physique of the Negro American, 89.
  64. John William Trask, “The Significance of the Mortality Rates of the Colored Populations of the United States”, American Journal of Public Health, 6, 1916, 254–60; Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 117–20.
  65. Alice Hamilton, Industrial Poisons in the United States. Nova York: Macmillan Company, 1929; Alice Hamilton, Exploring the Dangerous Trades. Boston: Little, Brown and Company, 1943.
  66. Alice Hamilton, “Industrial Diseases, with Special Reference to the Trades in Which Women Are Employed”, Charities and the Commons, 5 set. 1908.
  67. Hamilton, Industrial Poisons in the United States, 94–109; Alice Hamilton, Industrial Poisons Used in Rubber Industry. Washington DC: Government Printing Office, 1915, 13.
  68. Hamilton, Industrial Poisons Used in Rubber Industry, 6.
  69. Hamilton, Industrial Poisons Used in Rubber Industry, 26–30.
  70. Bethune citado em The Scalpel, The Sword, 95.
  71. Bethune citado em The Scalpel, The Sword, 250.
  72. Bethune citado em The Scalpel, The Sword, 93–94.
  73. Pritha Chandra e Pratyush Chandra, “Bethune’s Socialized Medicine and the Public Health Crisis Today”, The Bullet, 25 maio 2020.
  74. Bethune citado em The Scalpel, The Sword, 96.
  75. Norman Bethune, “A Plea for Early Compression in Pulmonary Tuberculosis”, Canadian Medical Association Journal, 27, n. 1, 1932, 37.
  76. Mao Zedong “In Memory of Dr. Norman Bethune”, em Away with All Pests, por Joshua S. Horn (Nova York: Monthly Review Press, 1971, 187–88).
  77. Salvador Allende citado em Waitzkin, The Second Sickness, 66.
  78. Waitzkin, The Second Sickness, 67.
  79. Waitzkin, The Second Sickness, 68.
  80. Waitzkin, The Second Sickness, 68–69.
  81. Sobre o golpe no Chile e a subsequente doutrina de choque neoliberal instituída sob a supervisão de Chicago, ver Naomi Klein, The Shock Doctrine. Nova York: Picador, 2008, 8, 70–80. Sobre os efeitos gerais do neoliberalismo na atenção à saúde, ver Howard Waitzkin (ed.), Health Care Under the Knife. Nova York: Monthly Review Press, 2018.
  82. Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 202.
  83. Hilary e Steven Rose, “The Problematic Inheritance: Marx and Engels on the Natural Sciences”, em Hilary Rose e Steven Rose (eds.), The Political Economy of Science. Londres; Macmillan, 1976, 1–13; Giovanni Ciccotti, Marcello Cini e Michelangelo De Maria, “The Production of Science in Advanced Capitalist Society”, em The Political Economy of Science, 36; Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 172–79.
  84. Barbara Ehrenreich e John Ehrenreich, The American Health Empire. New York: Random House, 1970; Barbara Ehrenreich e Deidre English, Witches, Midwives, and Nurses. Nova York: Feminist Press/City University of New York, 1973; Lesley Doyal, The Political Economy of Health. Londres: Pluto, 1979; Richard Levins e Richard Lewontin, The Dialectical Biologist. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1985; Vicente Navarro, “A Historical Review (1965–1997) of Studies on Class, Health, and Quality of Life: A Personal Account”, International Journal of Health Services, 28, n. 3, 1998, 389–406; Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 172–79; David U. Himmelstein e Steffie Woolhandler (eds.), “Science, Technology and Capitalism”, edição especial da Monthly Review, 38, n. 3 (jul.-ago. 1986); David U. Himmelstein e Steffie Woolhandler, “The Corporate Compromise: A Marxist View of Health Policy”, Monthly Review, 42, n. 1 (maio 1990), 14–29. Woolhandler e Himmelstein são o primeiro e o segundo autores do Lancet Commission Report sobre saúde nos Estados Unidos, de fevereiro de 2021: Steffie Woolhandler et al., “Public Policy and Health in the Trump Era”, Lancet, 10 fev. 2021. O Lancet Commission Report conclui: “Os recursos para combater a mudança climática, elevar os padrões de vida, eliminar as barreiras financeiras ao ensino superior e à assistência médica, atender às responsabilidades de ajuda global e capacitar as comunidades oprimidas nos EUA devem vir de impostos sobre os ricos e de cortes profundos nos gastos militares. Para a atenção à saúde, a dependência excessiva do setor privado aumenta os custos e distorce as prioridades, o governo deve ser um realizador, e não apenas um financiador, por exemplo, fornecendo diretamente cobertura de saúde e se envolvendo no desenvolvimento de medicamentos, em vez de pagar empresas privadas para realizar tais funções”.
  85. Krieger, Epidemiology and the People’s Health, 203.
  86. Hogben, Science for the Citizen, 960.
  87. Lewontin e Levins, Biology Under the Influence, 244–51; Richard Lewontin, The Triple Helix. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2000.
  88. Ian Angus, “Superbugs in the Anthropocene”, Monthly Review, 71, n. 2 (jun. 2019), 1–28; Marx and Engels, Collected Works, v. 25, 460–61.
  89. Levins, “Is Capitalism a Disease?”, 18–20.
  90. Don Fitz, Cuban Health Care. Nova York: Monthly Review Press, 2020, 216–18; Helen Yaffe, “Cuba Libre to COVID-Libre”, Canadian Dimension, 15 abr. 2021.
  91. Augustín Lage Dávila, “Socialism and the Knowledge Economy: Cuban Biotechnology”, Monthly Review, 58, n. 7 (dez. 2006), 50–58; Lewontin e Levins, Biology Under the Influence, 352.
  92. Rob Wallace, Big Farms Make Big Flu. Nova York: Monthly Review Press, 2016, 297–315; Rob Wallace, Dead Epidemiologists. Nova York: Monthly Review Press, 2020.
  93. Alex Liebman, Ivette Perfecto e Rob Wallace, “Whose Agricultures Drives Disease?”, Agroecology and Rural Economics Research Corps, 5 out. 2020; Rob Wallace, Alex Liebman, Luis Fernando Chaves e Rodrick Wallace, “COVID-19 and Circuits of Capital”, Monthly Review, 72, n. 1 (maio 2020), 12; Robert G. Wallace, Luke Bergmann, Richard Kock, Marius Gilbert, Lenny Hogerwerf, Rodrick Wallace e Mollie Holmberg, “The Dawn of Structural One Health”, Social Science and Medicine, 129, 2015, 68–77; Rob Wallace, “We Need a Structural One Health”, Farming Pathogens, 3 ago. 2012.
  94. Wallace, Dead Epidemiologists, 101.
  95. Riccardo Bellofiore, “The Winters of Our Discontent and the Social Production Economy”, Review of Political Economy, 14 abr. 2021, 12, 14.

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