Cinco Características do Neoimperialismo: Desenvolvendo a Teoria Leninista do Imperialismo no Século XXI (Parte III)
Por Chang Enfu e Lu Baolin. Texto publicado em 01 de maio de 2021 na Monthly Review.
Traduzido por Lucas Chagas e revisado por Rebecca Borges.
Hegemonia cultural dominada pelos “valores universais” ocidentais
Além de seu poderio econômico e da hegemonia exercida por meio de suas alianças militares, o neoimperialismo também é caracterizado pela hegemonia cultural dominada pelos “valores universais” ocidentais. O cientista político norte-americano Joseph Nye enfatizou que soft power é a capacidade de realizar os desejos de alguém por meio da atração, em vez da força ou compra. O soft power de um país é constituído principalmente por três recursos, a saber, cultura (que funciona onde é atraente para a população local), valores políticos (que funcionam quando podem realmente ser praticados dentro do país e no exterior) e política externa (que funciona quando é considerada como estando em conformidade com a legalidade e como aumentando o prestígio moral).42 Os países desenvolvidos ocidentais, especialmente os Estados Unidos, utilizam seu capital, tecnologia e vantagens de mercado para infiltrar países e regiões menos poderosos com sua cultura, e propor uma série de “novas teorias culturais intervencionistas” destinadas a impor os valores dos EUA. Os Estados Unidos subjugam os mercados culturais e os espaços de informação de outros países, especialmente os países em desenvolvimento, exportando para eles valores e estilos de vida estadunidenses, com o objetivo de tornar sua cultura a “cultura dominante” do mundo.43
A hegemonia cultural ou imperialismo cultural exporta os “valores universais” do Ocidente e implementa tanto a evolução pacífica quanto as “revoluções coloridas” controlando o campo da opinião pública internacional. O objetivo é alcançar a meta estratégica de Richard Nixon de “vitória sem guerra”. A evolução da União Soviética e dos países socialistas da Europa de Leste é um caso típico. Como se sabe, a penetração de valores costuma ser lenta, de longo prazo e sutil, e seus canais de comunicação costumam estar ocultos em intercâmbios acadêmicos, obras literárias, filmes e programas de televisão. Por exemplo, Hollywood é “o megafone da política hegemônica americana… Os filmes de Hollywood estão exibindo as vantagens dos Estados Unidos para o resto do mundo e tentando alcançar sua conquista cultural dessa forma.”44 O ex-funcionário sênior da CIA Allen Dulles argumentou: “Se ensinarmos os jovens na União Soviética a cantar nossas canções e dançar com elas, mais cedo ou mais tarde os ensinaremos a pensar da maneira que precisamos.”45 As fundações e think tanks também são forças motrizes importantes para a propagação do neoliberalismo. Por exemplo, a Fundação Ford dos EUA, a Fundação Rockefeller, a Sociedade Mont Pelerin e o Centro de Empreendimentos Privados Internacionais participam da promoção dos valores neoliberais por meio do financiamento de seminários e organizações acadêmicas.
Lênin afirmou uma vez: “Em vez de um monopólio não dividido da Grã-Bretanha, vemos algumas potências imperialistas disputando o direito de compartilhar este monopólio, e essa luta é característica de todo o período do início do século XX.”46 Desde o final da Guerra Fria, o capitalismo global foi caracterizado pelo monopólio não dividido dos Estados Unidos. Outros poderes não têm intenção e não têm força para competir. Alguns países individuais, como o Japão, tentaram desafiar os “direitos de monopólio” dos EUA econômica e tecnologicamente, mas acabaram falhando. O mesmo ocorre com a União Europeia, que surgiu mais tarde, mas acabou não conseguindo abalar a hegemonia dos EUA. No campo militar, a Guerra do Golfo e as guerras subsequentes no Kosovo, Afeganistão, Iraque, Líbia e Síria alimentaram ainda mais o unilateralismo e a arrogância hegemônica dos EUA. Com a ajuda de suas alianças econômicas, militares e políticas, e empregando soft power cultural, os Estados Unidos promovem seus “valores universais”, incitam protestos de rua e revoluções coloridas em outros países, e forçam países em desenvolvimento a desregulamentar seus sistemas financeiros, visando à criação de dívidas e crises financeiras. Quando o sistema de governança global dominado pelos Estados Unidos encontra desafios, ele lança guerras comerciais, guerras científicas e tecnológicas, guerras financeiras e sanções econômicas, e até chega a ameaçar ou realmente lançar ataques militares. O dólar americano, as forças armadas e a cultura são os três pilares da hegemonia imperialista dos EUA, apoiando o “hard power”, “soft power”, “strong power” (sanções econômicas) e “smart power”.47
Em suma, a aliança capitalista monopolista internacional composta de um país hegemônico e várias grandes potências fornece a base econômica para a política do dinheiro, cultura vulgar e ameaças militares que exploram e oprimem por meio do exercício do monopólio interno e externo, e que amplificam o poder dos Estados Unidos como o poder hegemônico neoimperialista.
A essência econômica, a tendência geral e as quatro formas de fraude ideológica
Lênin caracterizou o imperialismo como um capitalismo transitório e moribundo. No estágio neoimperialista, conhecido como globalização econômica, a contradição básica da economia capitalista contemporânea se manifesta na contradição entre, por um lado, a constante socialização e globalização da economia com seus fatores de produção sob propriedade privada, coletiva ou estatal, e, por outro, a desordem ou anarquia da produção nas economias nacionais e na economia mundial.48 O neoimperialismo exclui os ajustes que os Estados e as comunidades internacionais precisam fazer, ao invés disso, promove a autorregulação pelo capital monopolista privado e defende seus interesses. O efeito, muitas vezes, é intensificar várias contradições dentro dos países ou em nível mundial. As crises econômicas, financeiras, fiscais, sociais e ecológicas tornaram-se doenças epidêmicas. Várias dessas crises estão entrelaçadas com contradições sociais ou com as contradições da acumulação de capital. Todos eles juntos dão uma nova forma ao capitalismo monopolista e predatório, hegemônico e fraudulento, parasitário e decadente, transitório e moribundo, da época atual.
Se definirmos o neoimperialismo quanto à sua natureza econômica e tendências gerais, podemos concluir que suas três características se manifestam no sentido de que as contradições globalizadas e as várias crises do sistema frequentemente se intensificam.
A essência econômica do neoimperialismo é que ele é um capitalismo financeiro monopolista estabelecido com base em multinacionais gigantes. O monopólio de produção e o monopólio financeiro das empresas multinacionais têm suas origens no estágio superior de produção e concentração de capital, dando origem a uma fase em que o monopólio é mais profundo e amplo a tal ponto que “quase todas as indústrias estão concentradas em cada vez menos mãos.”49 A indústria automobilística pode ser tomada como exemplo. A produção das cinco maiores corporações automobilísticas multinacionais responde por quase metade da produção automotiva global, e a das dez maiores representa 70%.50 O capital financeiro monopolista internacional não apenas controla as principais indústrias do mundo, mas também monopoliza quase todas as fontes de matéria-prima materiais, talento científico e tecnológico e mão de obra física qualificada em todos os campos, controlando os centros de transporte e diversos meios de produção. Ele domina e controla o capital e controla várias outras funções globais por meio de bancos e uma variedade de derivativos financeiros e sistemas de participação acionária.51 Se considerarmos o valor total de mercado e a receita total e ativos das corporações, a escala das principais concentrações de poder econômico ao redor o mundo está crescendo, especialmente no caso das cem maiores corporações. Em 2015, o valor de mercado das cem maiores empresas do mundo era mais de sete mil vezes o das outras duas mil empresas em um banco de dados das maiores empresas não financeiras do mundo, em comparação com apenas trinta e uma vezes em 1995.52 De acordo com os dados da Fortune Global 500 para o ano de 2017, a receita de 380 das 500 maiores empresas do mundo (excluindo as empresas chinesas) atingiu US$ 22,83 trilhões, equivalente a 29,3% do produto mundial bruto. Os lucros totais alcançaram US$ 1,51 trilhão, quebrando o recorde, e a taxa de lucro aumentou 18,85% ano a ano.53 O aumento nos indicadores de participação nos lucros e taxa de lucro ilustra a natureza predatória do neoimperialismo.
Dado que a globalização econômica, a financeirização e as políticas neoliberais estão pressionando três vezes o trabalho, os lucros estão crescendo rapidamente, enquanto os salários dos trabalhadores estão aumentando muito mais lentamente.54 Entre 1982 e 2006, o crescimento médio anual dos salários reais dos trabalhadores da produção em corporações não financeiras nos Estados Unidos foi de apenas 1,1%, não apenas muito inferior aos 2,43% registrados de 1958 a 1966, mas também inferior aos 1,68% durante a recessão econômica de 1966 a 1982. A desaceleração do crescimento dos salários permitiu que a participação nos lucros das corporações aumentasse 4,6% durante esse período e foi responsável por 82% da recuperação da taxa de lucro. O “aperto do trabalho” pode ser visto como tendo desempenhado um papel fundamental nisso.55 Além disso, desde que a economia dos EUA começou a se recuperar, em 2009, da Grande Crise Financeira, a taxa média de lucro, embora inferior ao seu pico em 1997, ainda foi significativamente mais alta do que durante o final dos anos 70 e início dos anos 80, quando estava em um ponto baixo.56 A essência do neoimperialismo é sua necessidade de controlar e saquear. Seu impulso para a “acumulação predatória” não é apenas demonstrado por sua exploração do trabalho no cenário nacional, mas também por sua pilhagem de outros países. As formas que isso assume e os métodos empregados consistem principalmente no seguinte:
Primeiro, pilhagem financeira. O neoimperialismo extrai enormes lucros de seu controle sobre os preços das principais commodities internacionais. Por meio da financeirização e de outros métodos, pressiona os países produtores de matérias-primas, buscando manter os preços baixos. Como parte de suas pressões e perseguições, ele pode criar bolhas e crises financeiras por meio de entradas e saídas de capital em grande escala, afetando a estabilidade econômica e política dos países envolvidos. Ou pode buscar obter uma “vitória sem guerra” ao impor sanções financeiras.57 A inovação financeira e o atraso na regulamentação governamental contribuem para ondas de especulação improdutiva. Os oligarcas financeiros e as corporações multinacionais no topo da pirâmide se beneficiam da inflação dos preços dos ativos financeiros e são capazes de saquear enormes quantidades de riqueza social.
O segundo é a privatização de recursos públicos e ativos estatais. Desde que o Thatcher-Reaganismo passou a dominar a formulação de políticas econômicas em vários países, há cerca de quarenta anos, o mundo passou por uma onda massiva de privatizações em grande escala. Os ativos públicos de muitos países menos desenvolvidos caíram nas mãos do capital monopolista privado e dos monopólios corporativos multinacionais. O nível global de desigualdade de propriedade de riqueza aumentou proporcionalmente. O World Inequality Report [Relatório da Desigualdade Mundial] de 2018 revela que, desde a década de 70, a riqueza privada em vários países geralmente aumentou, enquanto a proporção da renda privada em relação à nacional na maioria dos países “ricos” aumentou de 200–350% para 400–700%. Em nítido contraste, a riqueza pública diminuiu continuamente. A riqueza pública líquida dos Estados Unidos e do Reino Unido caiu para um número negativo nos últimos anos, e a do Japão, Alemanha e França está apenas ligeiramente acima de zero. O valor limitado dos bens públicos restringe a capacidade dos governos de ajustar a desigualdade de renda [income gap].58
O terceiro é o fortalecimento do padrão centro-periferia. Os países neoimperialistas reforçam o padrão centro-periferia por meio de suas posições dominantes no comércio, moeda, finanças, arena militar e organizações internacionais. Aproveitando essas posições, extorquem continuamente os recursos e as riquezas dos países periféricos para consolidar seu status de monopólio ou oligopólio e para garantir seu próprio desenvolvimento e prosperidade. A taxa de transferência internacional de mais-valia tem um efeito positivo sobre a taxa geral de lucro dos países hegemônicos.59 Somente os países neoimperialistas são capazes de usar seu poder econômico, político e militar para transformar uma parte da mais-valia criado por países subdesenvolvidos em sua própria riqueza nacional. Consequentemente, a acumulação de capital monopolista pelo neoimperialismo intensifica a polarização entre ricos e pobres e prejudica a subsistência de pessoas em países como os Estados Unidos e a França (conforme comprovado pelo movimento internacional Occupy Wall Street, que envolveu oitenta países com seu slogan “nós somos os 99%”), ao mesmo tempo que reforçam a acumulação de riqueza financeira e ambiental nos países do“ centro ”e de pobreza relativa e poluição nos países da“ periferia”. Em 2018, o PIB combinado dos países “centrais” do G7 atingiu US$ 317 trilhões, respondendo por 45,5% do produto mundial bruto.60 De acordo com o Global Wealth Report [Relatório da Riqueza Global] de 2013, preparado pelo Credit Suisse, a riqueza das 85 pessoas mais ricas do mundo naquele ano foi equivalente aos ativos totais dos 3,5 bilhões de pessoas mais pobres do mundo, ou seja, da metade da população global.61
Hegemonia econômica e fraude
O imperialismo representado pelos Estados Unidos emprega hegemonia, intimidação e unilateralismo e segue padrões de dupla moral na política diplomática. A certa altura, Pompeo admitiu publicamente e expressou orgulho pelas ações fraudulentas de seu país. “Eu era o diretor da CIA”, disse ele. “Nós mentimos, enganamos, roubamos. Era como se tivéssemos cursos de treinamento inteiros… isso lembra a você a glória do experimento americano.”62 Na era do pós-Guerra Fria, os Estados Unidos dominam o mundo, livre de quaisquer controles e equilíbrios poderosos. Ele conta com suas principais vantagens de força militar, hegemonia do dólar americano, propaganda externa, ciência e tecnologia, para realizar bullying em todo o mundo e cometer fraudes dentro do país e no exterior.63
Em março de 2018, os Estados Unidos emitiram um documento intitulado Conclusões da investigação sobre atos, políticas e práticas da China relacionadas à transferência de tecnologia, propriedade intelectual e inovação, de acordo com a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974, que acusa a China de “impor ou obrigar as empresas dos EUA a transferir tecnologia ”e“ invadir ilegalmente redes comerciais de computadores dos EUA para roubar direitos de propriedade intelectual e informações comerciais confidenciais”. O objetivo deste documento era criar um pretexto para lançar uma guerra comercial; suas acusações não passam de boatos e não correspondem aos fatos. Qual é a fonte do progresso tecnológico da China? É resultado dos esforços de empreendedores talentosos que se beneficiam de enormes investimentos governamentais em ciência básica. Como disse o ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Lawrence Summers, “vem de um sistema educacional que privilegia a excelência, concentrando-se em ciência e tecnologia. É daí que vem sua liderança, não de assumir uma participação em alguma empresa dos Estados Unidos.”64 Ao provocar seu conflito econômico e comercial com a China, os Estados Unidos têm uma intenção óbvia: chantagear e suprimir a China de maneira geral, começando com a guerra comercial e gradualmente expandindo para as áreas de ciência e tecnologia, finanças, alimentos, recursos e assim por diante. As autoridades dos EUA procuram enfraquecer os pontos fortes da China no comércio, finanças, indústria e tecnologia, tentando garantir que a China não representará um desafio para a posição hegemônica global dos Estados Unidos.
Com seu slogan “America First”, o governo Trump promoveu a hegemonia dos EUA e impôs sanções econômicas a outras economias. Suas políticas econômicas e comerciais visavam principalmente a China, mas também eram dirigidas a aliados tradicionais, como União Europeia, Japão, Índia e Coréia do Sul. Sistematicamente, Washington pratica extorsão econômica e contenção. Nunca será esquecido que já em meados da década de 80 os Estados Unidos forçaram o Japão a assinar o Plaza Accord e o induziram a implementar uma política monetária de juros baixos que trouxe grandes quantidades de capital estrangeiro para o Japão. O resultado foi que um aumento na demanda de curto prazo por ienes japoneses fez com que a moeda do país se valorizasse fortemente em relação ao dólar americano. O influxo de capitais estrangeiros e a política monetária de juros baixos provocaram um aumento vertiginoso dos preços dos ativos japoneses. Apesar da prosperidade de curto prazo, o resultado final envolveu grandes perdas para o Japão. Os altos preços dos ativos significaram que o capital estrangeiro logo foi sacado e retirado, enquanto a economia japonesa sofreu enormes reveses e passou pelos “vinte anos perdidos”.
Hegemonia Política e Fraude
Os Estados Unidos sempre se autodenominaram um representante dos países que defendem a democracia, a liberdade e a igualdade. Por meios políticos e diplomáticos, não medem esforços para impor seu sistema político a outros países, especialmente aos estados em desenvolvimento que identifica como “ditaduras”. O ex-presidente dos Estados Unidos George W. Bush identificou o Irã, o Iraque e a Coreia do Norte como um “eixo do mal”. Os Estados Unidos exercem pressão sobre os governantes desses países, aplicando dois pesos e duas medidas em questões de direitos humanos. Usando sua propaganda, demonizam esses estados como “antidemocráticos” e “autocráticos”, ao mesmo tempo que subsidiam organizações não-governamentais e a mídia, além de incitar dissidentes e a oposição a organizarem “revoluções coloridas” com o objetivo de derrubar os governos legítimos.
Agindo a mando de seus círculos militares e grupos monopolistas de energia, os Estados Unidos têm sido uma força consistentemente destrutiva no Oriente Médio e na América Latina. A Síria foi listada por Washington entre os seis países “do mal”, e os Estados Unidos classificaram o governo sírio liderado por Bashar al-Assad como ilegal. O senador norte-americano John McCain, no entanto, revelou o verdadeiro propósito por trás dessas medidas. “O fim do regime de Assad”, afirmou McCain, “cortaria a tábua de salvação do Hezbollah com o Irã, eliminaria uma ameaça de longa data a Israel, reforçaria a soberania e a independência do Líbano e infligiria uma derrota estratégica ao regime iraniano. Seria um sucesso geopolítico de primeira ordem”.65 Na América Latina, os Estados Unidos continuaram seu bloqueio a Cuba, apesar de vinte resoluções aprovadas de forma esmagadora na Assembleia Geral da ONU. Enquanto isso, os Estados Unidos estão conduzindo um bloqueio econômico contra a Venezuela, resultando na deterioração econômica do país nos últimos anos. O ex-vice-presidente dos Estados Unidos Mike Pence, deixando de lado as eleições da Venezuela e o apoio popular ao governo, sem levar em consideração a verdade — mesmo deixando de fora a guerra de cerco econômico dos Estados Unidos à Venezuela em violação do direito internacional — declarou: “As gangues cruéis do governo de Maduro paralisaram a economia… O verdadeiro custo dos crimes do regime de Maduro não pode ser avaliado em números… Dois milhões de pessoas fugiram devido à ditadura e à repressão política que resultou em privações e criou condições de quase fome. Os Estados Unidos continuarão ajudando o povo venezuelano a restaurar sua liberdade. As pessoas serão livres.”66
Os Estados Unidos agora aplicam à China o tipo de política de Guerra Fria que costumava ser empregada contra a União Soviética. O diretor de planejamento político do Departamento de Estado, Kiron Skinner, descreve as relações turbulentas dos Estados Unidos com a China como “uma luta com uma civilização realmente diferente e uma ideologia diferente”.67 A classe dominante dos Estados Unidos sabe muito bem que o sistema socialista é superior ao capitalista. Uma vez que grandes países socialistas como a ex-União Soviética e a China se tornem ricos e fortes por meio da competição pacífica, é inevitável que enfrentem os objetivos hegemônicos dos Estados Unidos, que buscam nada menos do que um mundo unipolar. Quaisquer tentativas de promover amplas reformas na desatualizada ordem econômica e política imperialista são vistas como uma ameaça à hegemonia dos EUA. Consequentemente, os Estados Unidos adotaram a estratégia dupla de “contato e contenção”, engajamento e agressão, que procuram se passar por “evolução pacífica”.
Na realidade, as assim chamadas políticas democráticas nos Estados Unidos não passam de uma ilusão. Em primeiro lugar, o processo eleitoral nos Estados Unidos tem cada vez mais representado uma luta política entre os dois partidos da burguesia monopolista. Enquanto os candidatos de diferentes facções da burguesia monopolista faziam campanha eleitoral, eles recorreram a boatos, ataques pessoais e calúnias contra seus oponentes, deixando de lado a questão real. Em segundo lugar, as assim chamadas políticas democráticas nos Estados Unidos envolvem apenas uma democracia pro forma e procedimental. O sistema de votação pro forma foi reduzido a política monetária, política familiar e política oligárquica — isto é, a um “despotismo de capital monopolista” essencialmente não democrático, ou a uma democracia para poucos.
Hegemonia Cultural e Fraude
O ex-Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos Brzezinski acredita que “fortalecer a cultura americana como ‘modelo’ das culturas do mundo é uma estratégia que deve ser implementada pelos Estados Unidos para manter a hegemonia.”68 A hegemonia cultural dos Estados Unidos se manifesta principalmente por meio do controle dos meios de comunicação e educação, e por meio da função de propaganda, tanto no país quanto no exterior, de sua literatura e arte, sua academia de artes liberais e seus valores. Os Estados Unidos exportam filmes, música e literatura para todo o mundo. Eles controlam quase 75% dos programas de televisão do mundo e possuem poderosas empresas de cinema e televisão, como WarnerMedia, Universal Pictures, Paramount Pictures e Columbia Pictures, que todos os anos produzem dezenas de filmes de alto orçamento envolvendo investimentos de centenas de milhões de dólares. Pesquisas e reportagens realizadas pela grande mídia dos EUA efetivamente dominam a formação da opinião pública mundial. Os Estados Unidos também controlam as revistas oficiais que moldam o discurso na área da academia de artes liberais, e são os Estados Unidos que determinam os padrões da educação de elite. O Ranking QS World University de 2020 fornece um exemplo. Os primeiros lugares nessas classificações são todos ocupados por universidades dos EUA, e essa situação fornece uma ferramenta poderosa para espalhar “valores universais” ocidentais enganosos, visões constitucionais ocidentais e conceitos econômicos neoliberais em todo o mundo. Os pontos de vista básicos do estabelecimento das artes liberais dos Estados Unidos dominaram firmemente as elites e as massas no país e no exterior.69 Por exemplo, os Estados Unidos exaltam exemplos vulgares de kitsch literário e artístico como obras culturais distintas, merecedoras do Oscar ou de Prêmios Nobel.
A economia neoclássica (e sua contraparte na forma de neoliberalismo) é responsável por uma série de crises econômicas e pelo aumento da polarização entre ricos e pobres. No entanto, é descrita como uma teoria científica que promove o desenvolvimento, aumenta o bem-estar popular e é digna do Prêmio Sveriges Riksbank em Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel. Nos Estados Unidos, as obras que não estão em conformidade com os cânones literários, artísticos e das artes liberais do capital monopolista são difíceis de disseminar por meio da mídia oficial, enquanto escritores e artistas de real distinção são excluídos, suprimidos ou fraudados. Os Estados Unidos também detêm uma posição absolutamente dominante no campo global do ciberespaço. Dos treze servidores raiz do Sistema de Nome de Domínio, nove estão sob o controle direto de corporações, universidades ou departamentos governamentais dos EUA, enquanto outro é controlado diretamente por uma organização sem fins lucrativos dos EUA.70 Usando esses servidores raiz do Sistema de Nome de Domínio, os Estados Unidos podem facilmente roubar inteligência global, realizar monitoramento de rede e lançar ataques cibernéticos. O Programa de Vigilância PRISM, revelado por Edward Snowden, mostra que os Estados Unidos têm controle total sobre o hardware e software das redes globalmente, e são bem capazes de monitorar o mundo inteiro e atacar qualquer outro país. Por último, os Estados Unidos controlam a aliança de inteligência conhecida como Five Eyes (Cinco Olhos) (Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia), por meio da qual conduz atividades de monitoramento em larga escala e exerce a hegemonia cibernética nacional e internacionalmente.71
A hegemonia cultural dos Estados Unidos, seu controle sobre a academia de artes liberais e o uso fraudulento de que essas vantagens são feitas aparecem também nas posições adotadas pelos Estados Unidos em questões de ideologia e valores. Essas posturas são sempre hostis ao socialismo e ao comunismo e restringem o desenvolvimento dos países socialistas. Anteriormente, os Estados Unidos dedicaram a maior parte de seus esforços para difamar a União Soviética, mas o principal alvo agora é a China. No início de maio de 1990, Nixon declarou francamente: “Ao reconstruir a relação com a China, é muito importante que continuemos a pressioná-los a abandonar o socialismo. Porque usaremos essa relação para tornar as políticas da China mais amenas. Devemos nos ater a este ponto-chave.”72 De acordo com dados de pesquisa do US Pew Research Center — uma organização certamente influenciada pela hegemonia e fraude cultural dos Estados Unidos — 74% dos graduados em faculdades ou universidades chinesas amam a cultura dos Estados Unidos.73 É um fato que a maioria dos estudiosos de artes liberais chineses que estudaram nos Estados Unidos favorecem suas teorias acadêmicas institucionais básicas. Em graus variados, eles adoram, bajulam e temem os Estados Unidos. Isso afeta seriamente a confiança dos cidadãos chineses na cultura marxista, na cultura socialista e na rica cultura tradicional da própria China, e precisa ser eliminado o mais rápido possível.
Hegemonia Militar e Fraude
Desde a desintegração da União Soviética, os Estados Unidos tornaram-se cada vez mais presunçosos e tendem a recorrer à força militar ou a ameaças para lidar com questões de relações internacionais. Em 1999, as forças da OTAN lideradas pelos EUA bombardearam a República Federal da Iugoslávia, invocando a fórmula de “direitos humanos acima da soberania”. Em 2003, apesar da forte oposição de outros países, os Estados Unidos invadiram o Estado soberano do Iraque. A Guerra do Iraque não foi autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU e Washington não tinha base legal para sua intervenção militar. Os Estados Unidos alegaram falsamente que o Iraque possuía armas químicas de destruição em massa. Depois de ocupar o Iraque, no entanto, os Estados Unidos não encontraram evidências que provassem que o Iraque pudesse produzir armas químicas de destruição em massa. O verdadeiro propósito dos Estados Unidos ao fabricar essa mentira era controlar os recursos petrolíferos do Iraque por meios militares.
Os Estados Unidos têm enfatizado sistematicamente que seus próprios interesses devem estar em primeiro lugar e que suas vantagens militares não devem ser contestadas. Embora sua força econômica tenha diminuído em termos relativos, os Estados Unidos ainda estão expandindo seu arsenal e aumentando substancialmente seus gastos com defesa. Desde a Guerra Fria, os Estados Unidos continuaram a criar várias ameaças e pressões militares na Europa, no Oriente Médio e na região da Ásia-Pacífico. Para consolidar seu status hegemônico, os Estados Unidos defenderam e promoveram a expansão da OTAN para o leste, com o objetivo de incluir todos os países da Europa Central e Oriental na esfera de influência da OTAN e, assim, restringir o espaço estratégico da Rússia. No Oriente Médio, os Estados Unidos pretendem subverter os regimes legítimos de países como a Síria e o Irã por meios militares e apoiar as “revoluções coloridas” na região. Recentemente, na Ásia, Washington aumentou as tensões na península coreana e também implementou sua “estratégia indo-pacífica” destinada a conter a China. A “estratégia indiana” dos EUA está servindo para revelar a identidade de seus aliados e parceiros militares. Entre os aliados dos Estados Unidos estão Japão, Coreia do Sul, Austrália, Filipinas e Tailândia, e seus alegados “parceiros” incluem Cingapura, Taiwan (China), Nova Zelândia, Mongólia; vários países do sul da Ásia, como Índia, Sri Lanka, Maldivas e Nepal; e vários países do sudeste asiático, como Vietnã, Indonésia e Malásia. Os Estados Unidos também se propõem a fortalecer sua cooperação com Brunei, Laos e Camboja. Além disso, trabalharão em conjunto com aliados tradicionais, como Grã-Bretanha, França e Canadá para proteger a assim chamada liberdade e abertura do Indo-Pacífico.74
Com o aumento da força nacional da China, vários estudiosos dos EUA estão ansiosos para invocar a armadilha de Tucídides, alegando que é difícil que as relações sino-americanas escapem dessa lógica. Mas a verdade, como apontou o presidente da China, Xi Jinping, é que atualmente não há armadilha de Tucídides. Essa armadilha, no entanto, pode ser criada se os Estados Unidos e seus aliados cometerem repetidamente erros de cálculo estratégicos envolvendo grandes potências.75 Pode-se afirmar que são a hegemonia militar e a fraude dos Estados Unidos que fornecem a causa principal da instabilidade generalizada, constantes guerras locais, aumento de ameaças de guerra e crises de refugiados em todo o mundo.
O neoimperialismo é um imperialismo tardio, parasitário e decadente
Como Lênin afirmou,
O imperialismo é uma imensa acumulação de capital monetário em alguns países… Daí o extraordinário crescimento de uma classe, ou melhor, de um estrato de rentistas, ou seja, pessoas que vivem de “recortar cupons”, que não participam de qualquer empreendimento, cuja profissão é a ociosidade. A exportação de capital, uma das bases econômicas mais essenciais do imperialismo, isola ainda mais completamente os rentistas da produção e coloca o selo do parasitismo em todo o país que vive da exploração da mão-de-obra de vários países e colônias ultramarinas.76
Na era do neoimperialismo, o número de rentistas está aumentando drasticamente, e a natureza dos países rentistas está se tornando mais pronunciada. O parasitismo e a decadência de um pequeno número de países capitalistas se agravam ainda mais, como pode ser visto especificamente nos seguintes aspectos.
Em primeiro lugar, os Estados Unidos empregam sua hegemonia militar, de propriedade intelectual, política e cultural, bem como o dólar estadunidense, para pilhar a riqueza do mundo, especialmente a dos países em desenvolvimento. Os Estados Unidos são o maior país parasita em decomposição do mundo. Como prova disso, podemos tomar o comércio entre a China e os Estados Unidos. A China vende aos Estados Unidos bens produzidos com mão-de-obra barata, terras e recursos ambientais. Os Estados Unidos não precisam produzir nada para comprar esses bens; eles podem simplesmente imprimir notas. Com o dinheiro ganho, a China pode então comprar apenas ativos virtuais, como títulos do tesouro dos EUA, e fornecer financiamento para empréstimos ao consumidor e expansão externa dos EUA. Os Estados Unidos exportam para a China títulos aos quais valor algum não pode ser adicionado, enquanto a China exporta para os Estados Unidos principalmente bens físicos e serviços de trabalho. O Relatório Nacional de Saúde divulgado pelo Grupo Nacional de Pesquisa em Saúde da Academia Chinesa de Ciências mostra que os Estados Unidos são o país com os dividendos mais hegemônicos do mundo, devido à posição de sua moeda, enquanto a China é o país com as maiores perdas de dividendos hegemônicos. Para o ano de 2011, os dividendos hegemônicos dos EUA totalizaram US$ 7.396,09 bilhões, correspondendo a 52,38% do PIB do país, e os dividendos hegemônicos médios obtidos por dia chegaram a U$ 20,263 bilhões. Enquanto isso, a soma perdida pela China totalizou US$ 3.663,4 bilhões. Em termos de tempo de trabalho, cerca de 60% das horas de trabalho da força de trabalho chinesa foram efetivamente dadas sem recompensa para servir ao capital monopolista internacional.77
Em segundo lugar, os gastos militares aumentaram, o que por sua vez aumenta o fardo sobre a classe trabalhadora. O neoimperialismo lidera e promove a pesquisa científica e tecnológica militar, o desenvolvimento de armas avançadas e a expansão da produção militar. Como observou o People’s Daily em 2016, “o complexo militar-industrial apoiado pelo capital monopolista e a hegemonia cultural formada com base no colonialismo levaram os países ocidentais a intervir nos assuntos de outros países à vontade.”78 O neoimperialismo tornou-se assim o iniciador da turbulência e instabilidade regionais e o motor da guerra. Nos últimos trinta anos, os Estados Unidos gastaram US$ 14,2 trilhões em treze guerras.79 Enquanto isso, a falta de dinheiro impede melhorias nas condições de vida do povo estadunidense em áreas como planos de saúde. Gastos militares exorbitantes tornaram-se um fardo pesado para o país e seu povo, enquanto os monopólios parasitas na indústria de armamentos obtiveram lucros imensos. De acordo com estatísticas do Instituto Britânico de Estudos Estratégicos Internacionais, os gastos militares oficiais dos EUA em 2018 chegaram a US$ 643 bilhões e em 2019 chegarão a US$750 bilhões, mais do que a soma dos gastos militares das oito maiores potências militares do mundo atrás dos EUA. Desde o fim da primeira Guerra Fria, os Estados Unidos lançaram ou participaram de seis grandes conflitos: Guerra do Golfo (1991), Guerra do Kosovo (1999), Guerra do Afeganistão (2001), Guerra do Iraque (2003), Guerra da Líbia (2011) e Guerra da Síria (2011).80 O vício do capitalismo monopolista na guerra é uma manifestação de sua natureza parasitária e decadente. Esta característica bárbara do sistema vai contra a civilização e ameaça o futuro compartilhado da comunidade humana. Isso prova que o neoimperialismo é a raiz primária da guerra.
Terceiro, a riqueza e as receitas estão concentradas nas mãos de uma classe específica de proprietários de ativos financeiros, conforme refletido na formulação de 1% versus 99%. No estágio neoimperialista, a socialização, informatização e internacionalização da produção atingiram níveis sem precedentes, e a capacidade do ser humano de criar riqueza é muitas vezes maior do que no antigo período imperialista. No entanto, o avanço da produtividade que se supõe ser um ganho comum para a humanidade beneficiou principalmente a oligarquia financeira. “A maior parte dos lucros vai para os ‘gênios’ da manipulação financeira”, observa um observador.81 Em 2001, por exemplo, a riqueza financeira (excluindo direitos de propriedade) detida pelo 1% mais rico da população dos EUA era quatro vezes maior do que a dos 80% mais pobres. O 1% detinha ativos no mercado de ações de US$ 1,9 trilhão, aproximadamente o equivalente ao valor das ações detidas pelos outros 99%.82
Quarto, o monopólio impede a inovação tecnológica, retardando seu avanço. A ganância e o parasitismo do capital monopolista financeiro tornam sua atitude em relação à inovação tecnológica ambivalente. O capital monopolista depende da inovação tecnológica para manter seu status de monopólio, mas os altos lucros que resultam desse status significam que o capital monopolista mostra uma certa inércia na promoção da inovação. Mesmo que muitas funções avançadas de celulares sejam desenvolvidas com sucesso no mesmo ano, os produtores monopolistas de celulares dividirão essas funções para serem introduzidas e promovidas ao longo de vários anos. O objetivo é garantir que os consumidores comprem continuamente celulares com novas funções, permitindo que as empresas obtenham altos lucros de monopólio a cada ano.
Quinto, a tendência do capital monopolista e seus agentes de causar decadência no movimento de massa está se tornando mais séria. Lênin observou que “na Grã-Bretanha a tendência do imperialismo de dividir os trabalhadores, de fortalecer o oportunismo entre eles e de causar uma decadência temporária do movimento operário, revelou-se muito antes do final do século XIX e início do século XX.”83 O neoimperialismo divide a classe trabalhadora, atacando e enfraquecendo os sindicatos usando a desculpa fornecida pelo colapso da União Soviética e as tremendas mudanças na Europa Oriental. Também usa seus lucros advindos do monopólio para comprar o apoio de indivíduos e promove forças oportunistas e neoliberais dentro do movimento dos trabalhadores e de vários outros movimentos de massa. Os resultados de tais manobras incluem a queda no tamanho e na atividade dos sindicatos e outros movimentos progressistas, o declínio do movimento socialista mundial e uma tendência mais óbvia e grave que leva trabalhadores a venerarem as forças do neoimperialismo ou serem intimidados por elas.
O Neoimperialismo é um Capitalismo Tardio Transitório e Moribundo
Lênin, em seu livro Imperialismo, Estágio Superior do Capitalismo, revelou a natureza transitória e moribunda do capitalismo monopolista há mais de um século. No entanto, exceto em um número muito pequeno de países onde o socialismo está sendo construído, a maioria das sociedades capitalistas não pereceu. Na verdade, elas alcançaram diversos níveis de desenvolvimento e continuarão a se desenvolver. Isso levanta uma questão muito importante: como julgamos a natureza de transição do capitalismo contemporâneo, ou sua tendência a declinar e perecer? Se usarmos o método materialista histórico, a natureza de transição do neoimperialismo pode ser caracterizada com base em dois pontos. Em primeiro lugar, como tudo no mundo, o sistema neoimperialista está em constante mudança. É um fenômeno transitório na história humana e não é eterno. Em segundo lugar, há razões para acreditar que o neoimperialismo pode finalmente fazer a transição para o socialismo por meio de várias formas de luta revolucionária.
Na era do neoimperialismo, os países capitalistas desenvolvidos vem passando por muitas reformas tecnológicas e institucionais importantes, que forneceram a base para um certo desenvolvimento posterior do capitalismo e retardaram seu desaparecimento. Altas e baixas taxas de crescimento continuam se sucedendo, e o período de decadência mencionado por Lênin foi amplamente estendido. Isso ocorre porque os países capitalistas fizeram muitos ajustes em suas relações de produção e superestrutura, incluindo um grau de regulação macroeconômica, melhorias na distribuição de renda e seguridade social, e assim por diante. Em particular, não há dúvida de que, para os países capitalistas desenvolvidos, as vantagens da globalização econômica superam as desvantagens. Dentro do processo de globalização econômica, os poderosos países capitalistas desenvolvidos ocupam uma posição absolutamente dominante, através da qual se propõem a maximizar os benefícios que recebem. Seu impulso geral para estender a globalização a fim de expandir seus mercados não exclui, entretanto, a possibilidade de determinados países reverterem temporariamente o processo em resposta a crises domésticas, ou como parte dos esforços para prejudicar os concorrentes comerciais. “Nos últimos dois anos”, observa um estudo de 2019, “o governo Trump aprofundou sua tendência de globalização reversa à luz da crise doméstica. Ele aderiu ao princípio “America first e provocou disputas econômicas e comerciais internacionais, tentando se livrar e passar adiante a crise doméstica.”84 O objetivo dos Estados Unidos ao adotar uma série de medidas protecionistas antiglobalização é aliviar as dificuldades e crises domésticas que encontra na globalização econômica, a fim de promover seus interesses hegemônicos.
Enquanto isso, não há conflito essencial entre o fato de que o neoimperialismo e o capitalismo podem esperar existir e se desenvolver por algum tempo, e o fato de que uma transição para uma formação social superior é praticamente inevitável, desde que essas sociedades não degenerem para a barbárie. Os escritores marxistas clássicos evitaram estabelecer um cronograma específico para o fim do capitalismo e do imperialismo. O julgamento científico de Lênin é que “o imperialismo é um capitalismo decadente, mas não completamente decadente, um capitalismo moribundo, mas não morto.”85 Ele previu que o capitalismo moribundo provavelmente arrastaria sua existência por um período prolongado. Nem, com base em uma análise abrangente, poderia ser negado que o capitalismo veria algum tipo de desenvolvimento mesmo durante seu estágio moribundo. Discutindo a decadência do imperialismo, Lênin afirmou: “Seria um erro pensar que essa tendência à decomposição exclui o rápido crescimento do capitalismo — não… No seu conjunto, o capitalismo cresce com uma rapidez incomparavelmente maior do que antes, mas esse crescimento não só é cada vez mais desigual, como a desigualdade também se manifesta, de modo particular, na decomposição dos países mais ricos em capital (Inglaterra).”86
John Bellamy Foster também enfatizou que, “dizer que o capitalismo é um sistema falido não é, obviamente, sugerir que seu colapso e desintegração são iminentes. Mas sim, significa dizer que ele deixou de ser um sistema historicamente necessário e criativo em seu início, para ser um sistema historicamente desnecessário e destrutivo no século atual.”87
As contradições básicas do capitalismo ainda existem e continuam a se desenvolver. Da mesma forma, a lei da acumulação capitalista ainda existe e continua a se desenvolver. No ponto em que o capitalismo monopolista estava surgindo no final do século XIX e no início do século XX, a lei do desenvolvimento econômico e político desigual do imperialismo tornou possível que a revolução contra o capitalismo fosse vitoriosa inicialmente em um ou vários países, antes de eventualmente se espalhar globalmente.
Décadas depois que O Manifesto Comunista proclamou que o capitalismo iria expirar inevitavelmente e O Capital declarou que a sentença de morte da propriedade privada capitalista estava prestes a soar, a Revolução de Outubro trouxe a queda do Império Russo czarista. Então, o partido proletário liderado por Mao Tsé-Tung na China acabou com a sociedade semicolonial e semifeudal governada pelo Kuomintang (Mao afirmou que a China representava um capitalismo monopolista feudal e comprador após a Segunda Guerra Mundial). O Partido Comunista Soviético liderado por Mikhail Gorbachev e Boris Yeltsin conscientemente traiu o marxismo-leninismo, resultando na União Soviética e nos países socialistas do Leste Europeu, com exceção da Bielo-Rússia, regredindo ao capitalismo. Isso demonstra as voltas, reviravoltas e dificuldades gerais experimentadas pelo desenvolvimento do socialismo e seu sistema econômico. Mas não pode mudar a natureza e a tendência geral do processo histórico.
A posição da China nas principais linhas de falha internacionais é clara. Em outubro de 1984, Deng Xiaoping declarou: “Existem dois grandes problemas no mundo que são muito proeminentes. Um é a questão da paz e o outro é a questão Norte-Sul. Existem muitas outras questões, que não são da mesma importância subjacente ou significado global e estratégico como essas duas.” Em março de 1990, ele reiterou: “Quanto às duas questões principais de paz e desenvolvimento, a questão da paz não foi resolvida e a questão do desenvolvimento tornou-se mais séria.”88 Deng enfatizou que “paz e desenvolvimento” eram as duas principais questões a serem resolvidas.89
Com base na análise do caráter do neoimperialismo, pode-se concluir que o neoimperialismo representa uma nova fase do monopólio internacional em que o capitalismo se desenvolve após passar pelas fases de capitalismo competitivo livre, monopólio privado geral e monopólio estatal. Além disso, o neoimperialismo representa uma nova expansão do capitalismo monopolista internacional, bem como um novo sistema por meio do qual uma minoria de países desenvolvidos domina o mundo e implementa uma nova política de hegemonia econômica, política, cultural e militar. Se examinarmos a situação atual com base nas forças internacionais de justiça e no desenvolvimento das voltas e reviravoltas da luta de classes internacional, o século XXI é uma nova era em que a classe trabalhadora mundial e as massas podem realizar grandes revoluções e salvaguardar a paz mundial; em que os países socialistas possam realizar grandes façanhas de construção e promover a civilização ecológica; e no qual as nações progressistas podem trabalhar juntas para construir uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade, um mundo no qual o neoimperialismo e o capitalismo internacional gradualmente abram caminho para o socialismo global.
Notas
42. Wang Yan, “Review of Research on the Index System of Cultural Soft Power” [em chinês], Research on Marxist Culture 1 (2019).
43. Hao Shucui, “Making the Socialist Culture with Chinese Characteristics Blossom in the Contemporary World Cultural Garden: An Interview with Professor Wang Weiguang, Member of the Standing Committee of CPPCC, Director of the Committee on Nationalities and Religion” [em chinês], Research on Marxist Culture 1 (2018).
44. “Iranian Officials Slammed Hollywood Movies and Called them ‘Airfone,’” Huanqiu, February 3, 2012.
45. Xiao Li, “Talks of the American Politicians and Strategists on the Export of Ideology and Values” [em chinês], World Socialism Studies 2 (2016).
46. Lenin, Selected Works, 248.
47. Cheng Enfu e Li Linan, “Marxism and Its Localized Theories in China Are the Soul and Core of Soft Power” [em chinês], Research on Marxist Culture 1 (2019).
48. Cheng Enfu, “The New Era Will Accelerate the Process to Enrich People and Strengthen the Country,” Journal of the Central Institute of Socialism 1 (2018).
49. John Bellamy Foster, Robert W. McChesney, e R. Jamil Jonna, “Monopoly and Competition in Twenty-First Century Capitalism,” Monthly Review 62, no. 11 (2011): 1.
50. Foster, McChesney, e Jonna, “Monopoly and Competition in Twenty-First Century Capitalism,” 11.
51. Li Shenming, “Finance, Technology, Culture, and Military Hegemony Are New Features of Today’s Capital Empire” [em chinês], Hongqi Wengao 20 (2012).
52. Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, Trade and Development Report 2017 (Genebra: United Nations, 2017).
53. “Global 500, 2018,” Fortune, acessado em 23 de março de 2021.
54. A pesquisa de Li Chong também mostra que a taxa de mais-valia aumentou. De acordo com seus cálculos, de 1982 a 2006, o capital variável das corporações americanas aumentou de $ 1.505,616 bilhões para $ 6.047,461 bilhões, um aumento de 301,66%. Enquanto isso, o valor excedente aumentou de $ 674,706 bilhões para $ 3.615,262 bilhões, um aumento de 435,83%. Li Chong, Marx’s Law of the Falling Rate of Profit: Analysis and Verification” [em chinês], Contemporary Economic Research 8 (2018).
55. Lu Baolin, “Labor Squeeze and Profit Rate Recovery: A Discussion of the Neoliberal Accumulation System of Globalization and Financialization” [em chinês], Teaching and Research 2 (2018).
56. Guglielmo Carchedi e Michael Roberts, “The Long Roots of the Present Crisis: Keynesians, Austerians, and Marx’s Law,” World Review of Political Economy 4, no. 1 (2013): 86–115.
57. Xie Chang’an, “Research on the Evolution of International Competition Patterns in the Age of Financial Capital” [em chinês], World Socialism Study 1 (2019).
58. Facundo Alvaredo et al., World Inequality Report 2018 (Berkeley: World Inequality Lab, 2017), 15.
59. Wang Zhiqiang, “International Transfer of Surplus Value and the Change of the General Profit Rate: Based on the Empirical Evidence of 41 Countries” [em chinês], Journal of World Economy 11 (2018).
60. “GDP Ranking,” Banco Mundial, acessado em 23 de março de 2021.
61. Credit Suisse, Global Wealth Report 2013 (Zurique: Credit Suisse, 2013).
62. Tom O’Connor, “China Responds to Iran Capturing ‘U.S. Spies’: Remember When Mike Pompeo Said CIA Lies, Cheats and Steals?,” Newsweek, 23 de julho de 2019.
63. Trair é enganar as pessoas usando palavras e atos falsos para esconder a verdade. A fraude, o que é ainda pior, envolve atos enganosos cometidos por meios fraudulentos. Refere-se ao comportamento com a intenção de criar confusão e mal-entendidos.
64. Matthew J. Belvedere, “Larry Summers Praises China’s State Investment in Tech, Saying It Doesn’t Need to Steal from US,” CNBC, 27 de junho de 2018.
65. Zhu Changsheng, “The Real Purpose of the West Collectively Shaming Russia Finally Surfaces” [em chinês], Kunlunce, 12 de abril de 2018.
66. Mike Pence, “Remarks by Vice President Pence to Migrant Community at the Santa Catarina Shelter,” U.S. Embassy & Consulates in Brazil, 27 de junho de 2018.
67. “Stupid to Regard One Civilization as Exceptional,” China Daily, 22 de maio de 2019.
68. Zhang Yang e Yuan Yuan, “To What Extent Does American Culture Affect China?” [em chinês], People’s Tribune 7 (2017): 131–33.
69. Zhang e Yuan, “To What Extent Does American Culture Affect China?”.
70. Shen Yi, “The Debate on Principles of Global Cyberspace Governance and China’s Strategic Choice” [em chinês], Foreign Affairs Review 2 (2015): 65–79.
71. Yang Minqing, “Decoding US Cyber Hegemony: the ‘Victim of Cyber War’ Owns 100,000 Network Soldiers” [em chinês], Global View, 2015.
72. Liu Liandi, “Discussion by American Politicians and Newspapers of the Peaceful Evolution of China” [em chinês], International Data Information 8 (1991).
73. Zhang e Yuan, “To What Extent Does American Culture Affect China?”
74. Ma Xiaowen, “The United States Is Unleashing an Indo-Pacific Strategy to Shape a New Orient” [em chinês], China Times, 5 de junho de 2019.
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76. Lenin, Selected Works, 241.
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78. Han Zhen “The Institutional Roots of Social Chaos in the West” [em chinês]. People’s Daily, 23 de outubro de 2016.
79. Ma Yun, “Globalization Was Controlled by 6,500 Transnational Corporations in the Past,” Tencent Financial News, 19 de janeiro de 2017.
80. Zhu Tonggen, “An Analysis of the Legitimacy of the Major Wars Launched by the United States after the Cold War: Taking the Gulf War, the Afghanistan War, and the Iraq War as Examples” [em chinês], Global Review 5 (2018).
81. Lenin, Selected Works, 185.
82. John Bellamy Foster, “The Financialization of Capitalism,” Monthly Review 58, no. 11 (Abril, 2007): 7–8.
83. Lenin, Selected Works, 246–47.
84. Liu Mingguo, e Yang Junjun, “Beware of the New Round and More Serious Financial Crisis: An Analysis of the Economic Situation of the US in the Post-crisis Era” [em chinês], Economics Study of Shanghai School 1 (2019).
85. Lenin, Collected Works, vol. 23, 105.
86. Lenin, Selected Works, 260.
87. John Bellamy Foster, “Capitalism Has Failed — What Next?,” Monthly Review 70, no. 9 (Fevereiro, 2019): 1–24.
88. Deng Xiaoping, Collected Works of Deng Xiaoping, vol. 3 [em chinês] (Pequim: People’s Publishing House, 1993), 96, 353.
89. Li Shenming, “An Analysis of the Age and Its Theme” [em chinês], Hongqi Wengao 22 (2015).
Sobre os Autores
Cheng Enfu é professor titular da Universidade da Academia Chinesa de Ciências Sociais, diretor do Centro de Pesquisa para Desenvolvimento Econômico e Social da Academia Chinesa de Ciências Sociais e presidente da Associação Mundial de Economia Política. Ele pode ser contatado em 65344718[at]vip.163.com.
Lu Baolin é professor da Escola de Economia da Universidade Normal de Qufu.
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